Maior
empresa brasileira e uma das grandes petroleiras do mundo, a Petrobrás acaba de
lançar oficialmente,seu plano de investimentos para os próximos quatro anos. Os
números são grandiosos e — muito mais importante — as decisões por trás deles
afetarão por muitas décadas, para o bem ou o para o mal, a sociedade
brasileira.
Os
investimentos, até 2014, somarão 224 bilhões de dólares — quase 10% do PIB do
Brasil — o que tem imensa repercussão econômica e social. Um pequeno exemplo: a
decisão adotada pela estatal em 2003, de priorizar fornecedores nacionais, nas
compras de plataformas e navios,
ressuscitou dois ramos então moribundos da indústria brasileira. Agora, com a
empresa fortalecida pela descoberta das reservas de petróleo no pré-sal, este
poder está muito ampliado.
As
consequências mais importante dos planos da Petrobras dizem respeito exatamente
à extração de óleo. Segundo Sérgio
Gabrielli, presidente da companhia, ela ampliará sua produção em 9,4% ao
ano, até 2014. Naquele ano, o Brasil passará a extrair 3,9 milhões de
barris por dia — podendo tornar-se o quinto ou sexto produtor mundial e um
exportador importante. O aumento, nessa primeira fase, não virá dos campos do
pré-sal, o que sinaliza uma aposta no potencial das províncias brasileiras já
em operação (na foto, uma plataforma na Bacia de Campos). Já em 2020, a
produção passará a 5,4 milhões de barris ao dia — metade do que extrai, hoje, a
Arábia Saudita…
Apesar da
importância destes dados, os jornais abordam os projetos anunciados ontem de
forma rasteira e ideologizada. O sentido geral das oberturas é repercutir as
opiniões de “analistas do mercado”. Para eles, os investimentos são
“exagerados” (manchete de O
Estado de S.Paulo); podem “secar as fontes de recursos para as
empresas privadas (Folha)“;
e revelam um movimento semi-disfarçado para ampliar a presença estatal na
economia. É como se a Petrobrás estivesse investindo centenas de bilhões de
dólares para… fazer política em favor do estatismo. Estranhamente, seus planos
supérfluos e dispendiosos despertam interesse de grandes investidores
(capitalistas, é claro…) de todo o mundo.
Se ficar
restrita ao ramerrão da mídia, a sociedade perderá a oportunidade de fazer duas
discussões indispensáveis — até agora não abertas, a sério, pelo governo. Qual
deve ser o projeto
brasileiro para a
exploração das reservas de petróleo? E qual o ritmo mais adequado para
colocá-las em produção?
No
primeiro tópico, pode-se discutir como empregar os recursos advindos da
exportação de óleo para corrigir dívidas históricas da sociedade para si mesma.
Como reduzir a desigualdade? Quais os mecanismos para financiar, com o dinheiro
de uma energia suja, a pesquisa e produção de eletricidade a partir de fontes
como a solar e eólica? Como livrar as metrópoles da dependência em relação ao
automóvel?
O segundo
item envolve uma discussão mais técnica. Foi abordada didaticamente num artigo
de André Ghirardi, especialista em petróleo. Em seu texto, ele lembra que as
grandes companhias petroleiras estudam, desde os anos 1930, as melhores
estratégias para administrar
a produção, deslocando-a sempre que possível para períodos em que
os preços do óleo sejam mais altos. Este esforço teria se intensificado nos
últimos anos, quando ficou claro que a produção mundial começará brevemente a declinar.
Os países ricos, por exemplo, explica Ghirardi, têm adiado a exploração de
grandes reservas no Oceano Ártico e Golfo
do México (cujo enorme potencial apenas começa a ser retirado).
Qual a
posição do Brasil, diante de debates como esses? Em torno da riqueza do
pré-sal, é possível iniciar um grande debate nacional. Ele abriria espaço, inclusive, para a busca de soluções inovadoras em terrenos como educação,
ambiente, universalização dos serviços públicos, formas alternativas de
distribuição de riqueza, desenvolvimento da ciência e tecnologia. Mas para
chegar a tanto, será preciso criar espaços de debate público que superem o
discurso rastaquera da mídia.