Dois textos recentes e importantes sugerem que novas turbulências econômicas, potencialmente devastadoras, estão se armando nos circuitos financeiros internacionais. Elas poderiam ter repercussões graves no Brasil e exigiriam do governo, provavelmente, políticas muito mais ativas que as praticadas hoje. Vale a pena examiná-los.
O primeiro é um editorial da revista The Economist. Rememora o momento mais dramático da crise de 2008 – a falência do banco norte-americano Lehman Brothers, que completa cinco anos no próximo 15/9. E adverte: embora tenha havido algum progresso, desde então, “há novas crises no horizonte”; “as finanças globais estão muito distantes da segurança”.
“Onde estará o próximo Lehman Brothers”?, pergunta o texto no título. Que colapso financeiro poderia provocar, como dominó (veja imagem acima) uma reação em cadeia? O temor principal da revista é com a área do euro. Lá, os bancos continuam frágeis; em boa parte dos países, a recessão provocada pelas políticas de “austeridade” está entrando no quinto ano consecutivo, sem perspectivas de melhora; e os riscos de uma derrapada política capaz de sacudir este sistema débil são consideráveis, devido à própria instabilidade social. Segundo The Economist, haveria outros fatores de risco, embora menos graves. Entre eles, o alto endividamento do Japão, uma nova bolha imobiliária insustentável na Inglaterra, a hipótese de má administração do sistema bancário chinês e… a possível fuga em massa de capitais em países emergentes como Indonésia, Índia e Brasil.
O que provocaria esta fuga – que no caso brasileiro, resultou em crises cambiais desestabilizadoras, como as de 1998 e 2002-03? Vale examinar, a este respeito, um texto publicado em 8/9 pelo escritor e jornalista Michael Casey no Wall Street Journal. Ao analisar a recente reunião do G-20, em São Petesburgo, Casey destaca: o grupo de governantes mundiais “ignorou um elefante na sala: a instabilidade do sistema financeiro global”.
Só nos últimos quatro meses, lembra o artigo, as moedas de certos países do G-20 (como a Índia e a Indonéia) perderam 20% de seu valor. Outros “emergentes” vivem dificuldades semelhantes, embora menos agudas. Mas a causa principal não seriam problemas específicos de política econômica nas economias afetadas, e sim a ausência completa de controles sobre a circulação global de capitais.
Casey argumenta que fundos financeiros, corporações transnacionais e mega-ricos aproveitaram-se deste descontrole, nos últimos anos, para deslocar enormes massas de dinheiro das economias centrais para os emergentes – tirando proveito de taxas de juros mais elevadas. Agora, o ciclo está se invertendo rapidamente, porque o Banco Central dos EUA (o Federal Reserve) anunciou (mesmo sem concretizar, ainda), uma futura alta de suas próprias taxas.
O texto cita uma opinão de Joseph Stiglitz, Nobel de Economia: “o verdadeiro problema é muito claro: a natureza instável do sistema financeiro global, baseado no dólar. Por isso lamenta a completa ausência, na reunião do G-20, de qualquer medida, ou menos plano, para enfrentar tal instabilidade”.
Ela poderá, certamente, repercutir no Brasil, nos próximos meses. O país estará indefeso, enquanto não houver mudanças de fundo no sistema financeiro e monetário global? Certamente, não: há como agir, desde já. Mas o caminho para defender a economia brasileira é oposto às últimas decisões do governo Dilma e do Banco Central. Exige adotar unilateralmente, desde já, controles mais rígidos sobre a entrada e saída de divisas. Estas iniciativas contrariam os grandes investidores (que desejam liberdade absoluta para movimentar seus capitais). Mas dependem exclusivamente de decisão soberana dos Estados.
Até o momento, no entanto, o Brasil tem tomado medidas que ampliam sua própria vulnerabilidade. Nos últimos meses, os controles sobre os fluxos de divisas foram relaxados (por meio de redução das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras; e a taxa de juros interna, elevada). A lógica destas decisões é oferecer recompensas aos capitais externos, para que permaneçam no país. Mas se a tendência mundial que hoje prevalece se confirmar – ou seja, se as taxas de juros pagas pelos EUA começarem a aumentar – o país pode estar armando, para si mesmo, uma bomba-relógio…