Na ilusão de uma vida melhor ficam sem passaporte,
condenados à escravidão para construir um país que nunca será seu. Meros designers
de cidades à escala de um jogo de computador moderno onde apenas interessa ser
o maior ou o melhor. É esta visão futurista que nos faz querer perceber a
história alimentar de uma das cidades mais jovens do mundo. No avião a caminho
do Dubai, encaramos o rosto semi-coberto
da jovem que se senta ao nosso lado para perceber se a tradição milenar
religiosa se encontra na alimentação. Fala-nos em comida indiana e Burger King.
Quando perguntamos por comida local fica atrapalhada, não entende a pergunta.
Não podemos acreditar que a modernidade apagou os
vestígios da História. Aterrissamos decididos a desenterrar tradições
escondidas. A passagem pelo mercado das especiarias reduz a lista de
esperanças. A traça histórica é projetada por madeira oca de memórias e os
cheiros sufocam dentro de sacos de plástico cuidadosamente selados. Os
restaurantes de comida árabe só servem pratos libaneses, iranianos ou
marroquinos. Seguimos diretos para o maior
mercado da cidade, em Deira. Há variedade, mas tanto a maioria de produtos
como de vendedores é importada. Indianos e paquistaneses garantem o sustento
dos vinte por cento de árabes que mandam no país. Nada a fazer. Rendemo-nos às
evidências. A cidade cheira a nova.
O Burj Al Arab
é o único hotel no mundo com sete estrelas. Cobra ingresso para visitas, mas
como marcamos mesa no restaurante panorâmico temos acesso gratuito ao hotel.
Num país tão aberto à modernidade, não é de estranhar que o cardápio seja
ocidental. Subimos a 200 metros sobre o Golfo Pérsico e entramos curiosos para
ver o resultado. Salada niçoise, carpaccio de bife kobe que como o caviar, o
foie gras e a trufa branca,– denominação de origem como o champagne da região
francesa do mesmo nome – é uma iguaria para poucos. À primeira garfada, o
marinheiro de primeira mordida já sente que a extravagância compensa: o bife se
desmancha em múltiplos sabores. Graças à intensa marmorização interna – e dizem
que a gordura é “do bem” – ela é a mais macia e saborosa das carnes. Lendas
cercam o gado Wagyu, de onde ela provém – só bebe cerveja e é massageado ao som
de música clássica.
Na sobremesa, tarte
de ruibarbo, ( uma planta muito comum nos jardins do norte da América e da
Europa onde é cultivado para os seus caules - as folhas são tóxicas -
geralmente usados cozidos na confecção de compotas e sobremesas. Tem um sabor
delicado e levemente ácido que combina muito bem com coisas doces) com com frutas vermelhas
deslumbram pela apresentação. Falta o sabor da história, falta a personalidade
de alimentos nacionais... enfim, estrelas a mais!