A Associação de artistas alemães indignou-se e o seu
presidente, Frank Michael Zeidler, escreveu uma carta aberta protestando contra
o fato de o governo regional de Kiel «aprovar e divulgar a obra de um falsário,
utilizando, além disso, fundos públicos para uma exposição que a curiosidade
mórbida do público não chega para justificar». Harald Haase, porta-voz do
ministro da Economia Dietrich Austermann, um democrata cristão, reagiu, porém
com bonomia, afirmando que não via mal nenhum na iniciativa e que o eco tinha
sido «Extremamente positivo». A exposição foi, de fato, visitada por centenas
de pessoas, algumas das quais se deslocaram de propósito a Kiel.
A vida de Edgar
Mrugalla, de 70 anos, foi muito acidentada. Um verdadeiro romance! Em 1987
chegou a ser condenado a dois anos de prisão com pena suspensa, por violação
dos direitos de autor e fraude. Uma especialista do Louvre chamada a
pronunciar-se no seu julgamento, declarou que ele tinha «mãos de ouro». O mesmo
achava de resto a Stasi, a polícia política da antiga RDA, que lhe encomendava
obras de mestres que depois passava discretamente para o Ocidente por preços
bastante significativos.
Mrugalla cedo ficou órfão, teve uma infância miserável,
passou fome e frio, a família que o adotou andou errante dum lado para o outro,
como aconteceu a tantas famílias alemãs nos primeiros anos a seguir à II Guerra
Mundial. Não tirou qualquer curso nem aprendeu uma profissão. Sobrevivia de
biscates, feitos ao acaso: trabalhou como foguista num barco a vapor, lutou boxe
em feiras de aldeia, foi motorista de caminhão, vendeu bugigangas em feiras de
objetos roubados...
Certa vez ajudou a despejar uma casa cujo dono tinha
morrido; encontrou um quadro no sótão e vendeu-o por 50 marcos (25 euros).
«Semanas depois quase enfartei quando encontrei o mesmíssimo quadro à venda
numa firma leiloeira de obras de arte, mas desta vez por 70 mil marcos (35 mil
euros) — era um ‘Caspar David Friedrich’
autêntico». O destino batera-lhe à porta. Começou a copiar obras de grandes
mestres.
Mrugalla é um autodidata brilhante, dominando diversas
técnicas e estilos diferentes — tanto imita Cézanne como Rubens, tanto pinta aquarelas
como desenha a carvão ou lápis de cera, Aperfeiçoou técnicas para envelhecer as
telas. Por exemplo, chegou a guardá-las uns dias no congelador para depois as
meter no forno, conseguindo assim ludibriar peritos, diretores de galerias e
comerciantes de arte.
A sua produção foi impressionante: em 15 anos pintou
cerca de 3500 quadros. O «rei dos falsários» como lhe chama a imprensa,
reproduz com a mesma facilidade os velhos flamengos ou Picasso, este último um
dos seus pintores preferidos e mais frequentemente imitados. Costuma dizer,
aliás, que tem umas mãos tão grandes como as do mestre do cubismo. Só na década
de 80 ganhou cerca de 250 mil marcos com falsos «Picassos». Atualmente só copia
pintores que tenham morrido há mais de 70 anos, para não ser acusado de violar
os direitos de autor.
«Mas também pinto quadros em que não imito ninguém!
Tenho o meu próprio estilo», sublinha Edgar Mrugalla, que dá aulas de pintura
num museu de Busum, no Norte da Alemanha. Desde que se tornou famoso, as suas
falsificações vendem-se bem, sempre com a etiqueta «Autêntica falsificação do
atelier Mrugalla». E até conta que, por vezes, encontra obras suas expostas em
museus, tendo então o cuidado de avisar discretamente a direção. Ultimamente
assina as suas obras com o pseudónimo Aron Silbereise, o apelido da mãe, uma
judia provavelmente assassinada pelos nazistas, que ele nunca conheceu.
Edgar Mrugalla não é o primeiro falsário alemão famoso.
O mais espetacular foi sem dúvida Konrad
Kujau, que falsificou os «Diários de Hitler» pelos quais a revista «Stern»
pagou mais de nove milhões de marcos. Também ele era muito versátil — além de
imitar na perfeição a caligrafia de cinco ou dez personagens históricas ,reproduzia
quadros de quem fosse preciso. Aos dez anos, Kujau já ganhava uns trocos a
vender «autógrafos» de personalidades conhecidas.