Beré é viúva do comerciante Pedrinho e, ao lado das irmãs, todas viúvas, abre diariamente o estabelecimento que mantém as mesmas prateleiras, as mesmas bomboneiras onde armazenavam as deliciosas cocadas que muitas vezes comprei. Olhar aquele lugar é uma viagem à minha infância e à minha juventude, quando já morando fora daqui, visitava a cidade não deixava de passar para cumprimentar o Sr. Detinho.
Do outro lado da avenida, na esquina oposta, ficava o grupo de lojas que pertenceram ao meu avô, Joaquim Matias, destacando-se o imóvel que foi, por muito tempo ocupado pelo Tota, antes pelo meu avô, com uma loja de tecidos e também, por algum tempo, por meu pai que instalou ali a sua venda onde, lembro muito bem, aprendi a declamar o poema de Casimiro de Abreu:
MEUS OITO ANOS
Oh! Que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais...
Logo depois, no prédio onde hoje está instalada a Miro Móveis, meu pai, Jaime Amorim, construiu o primeiro prédio com dois pavimentos na Av. Ruy Barbosa, instalando no local, a sua loja “O Crediário”, uma revolução para a época: um magazine com quase mil metros quadrados onde vendia móveis e eletrodoméstico para todas a cidades da região e fez dele, além de um bem-sucedido comerciante, cidadão respeitável que deu uma enorme contribuição ao desenvolvimento da cidade.
Seguindo em frente, encontro várias residências que hoje são pontos comerciais, como a casa onde morou Sr. Apromiano e depois José Aras, a casa de Joaquim do Frade, de José Camerino, a casa onde morou Antônio Romeu e depois Oscarzão, a casa da família Macedo, Romildo, Raíldo e seus irmãos, e aí, chegamos no cruzamento da avenida com a Rua Elson Torres. De um lado, a loja de Nelusinho, pai de Mundinho Doido, um contador de histórias que fazia questão de exagerar nos seus “causos”, criando para si mesmo, a pecha do maior mentiroso da cidade. Do outro lado, onde hoje está a Real Calçados, estava a loja de tecidos do Zeca Dantas, que além de lojista, era também fazendeiro e hoteleiro. Esse, uma das referências da minha vida. Finalmente, onde está a Monte Santo Esportes, estava o Bar da Maria Senhora, ponto de encontro de todos nós nas festas de Natal e São João. Quando crianças, frequentávamos o local para comer os maravilhosos doces de D. Maria Senhora, em especial, a cocada de leite. Nas festas, na fase adulta, lembro de beber Whisky com Gilson e Clovis, respectivamente filho e genro de Bernardino Menezes, o fundador da Cal Sublime e um dos homens mais ricos de Feira de Santana que chegou a ser candidato a prefeito de Euclides da Cunha, sendo derrotado por Zuza Bezerra.
Maia Senhora era uma mulher guerreira, trabalhadora, briguenta, não levava desaforo para casa. Apesar do temperamento, ela era muito querida e respeitada, cozinheira insuperável, além dos doces, nas festas, expunha nas mesas, na calçada, os seus frangos assados, perus e outras guloseimas que deixava a meninada babando. Ao voltar a Euclides já com algum dinheiro, me lambuzei com todas aquelas delícias e como sempre, gastei comigo e com quem estava ao lado.
Está foto onde apareço com seu primogênito, Elias que ela chamava carinhosamente de Yá, foi feita por ela que sempre estimulou a nossa amizade; doce criatura!
E, para encerrar essas memórias, lembrei de uma recente conversa com o médico Hidelbrando Cerqueira Maia, querido amigo quase homônimo do advogado Hidelbrando Maia Cerqueira, este herdeiro da “venda” do pai dele, Dominguinhos, também uma das últimas construções da avenida, ainda com a configuração original. Hoje, está instalado lá, a Carvalho Bolsas. Pois bem, por conta da conversa com o médico Hidelbrando, cidadão de memória privilegiada que viveu aqui, parte da sua infância e adolescência, lembrou que o Posto do Dão, essa edificação revestida de pastilhas azuis, fora antes, o Posto do Sr. Gabriel, o único da cidade, instalado às margens da Rua da Bomba, trecho da BR116 que atravessava a cidade e hoje é a Avenida Almerindo Rehem. Ali, o pau de Arara que transportava a família do retirante pernambucano Luiz Inácio da Silva, em meados dos anos 50, reabasteceu e seguiu viagem para São Paulo. Bem que o combustível poderia ter acabado!