Cadeias de livrarias fazem o mesmo e agora também exigemque seus fiscais sejam capazes – sabe-se lá como – de identificar clientes que pareçam carregar quantidades avantajadas do material na mochila. Nos supermercados, os operadores das câmeras de segurança gastam a maior parte do tempo seguindo suspeitos de estarem armados com rolos de papel alumínio. Tudo porque larápios bem informados descobriram que a singela folhinha prateada que tanto ajuda as donas de casa nos assados dominicais tem o poder de simplesmente tornar inoperantes os modernos e milionários sistemas de segurança instalados nas grandes lojas do país.
Sacolas forradas com papel alumínio apreendidas pela Riachuelo em Belém
Ao que parece, a descoberta de que o papel alumínio é uma espécie de kriptonita para os alarmes aconteceu em Brasília há alguns anos. De uma hora para outra, gerentes de grandes lojas de departamento perceberam que estavam sendo furtados em um volume muito maior do que o normal, sem que os alarmes fossem ativados. “Às vezes, sumiam peças de uma arara inteira sem ficar nenhum rastro, nem etiquetas de segurança estouradas, nem sinal de alarme”, conta o responsável pela área de segurança de uma grande rede varejista. Após instalar mais câmeras e “aprimorar” as técnicas de questionamento junto àqueles pegos em flagrante, descobriu-se que a arma secreta utilizada pelos ladrões para burlar o sistema de segurança nada mais era que ela, a folha de papel alumínio. “Algum técnico deve ter revelado o segredo e agora a coisa saiu do controle”, diz o gerente, que não foi autorizado pela empresa para qual trabalha a dar entrevistas sobre o incômodo assunto.
O tal segredo é simples, porém eficaz. Qualquer etiqueta de segurança, seja ela grande e rígida, como aquelas pregadas nas roupas, ou quase imperceptíveis, como as que vêm transvestidas de código de barras, se tornam inoperantes quando envoltas em algumas poucas folhas de papel alumínio. “A verdade é que com três ou mais folhas envolvendo a etiqueta praticamente nenhum sistema funciona. O alumínio torna o acionamento do alarme inoperante”, reconhece Marcello Teixeira, gerente de soluções em vigilância eletrônica de mercadorias da Plastrom Sensormatic, a empresa líder no mercado brasileiro de sistemas antifurto para o varejo. Isso acontece porque em quase todas as lojas brasileiras, a tecnologia utilizada para acionar o alarme é feita por radiofrequência.
As etiquetas de segurança, em uma linguagem grosseira, estão adormecidas e, quando passam pelas antenas, aqueles sensores em forma de totens colocados nas portas das lojas, recebem uma carga elétrica, mínima, é verdade, mas que as faz emitir um sinal. Ao receber o sinal, as antenas disparam o alarme. O alumínio não permite que as ondas emitidas pelas antenas cheguem até a etiqueta, que, por sua vez, não emite nenhum sinal. Assim, o alarme não é disparado. O mesmo princípio impede que telefones celulares funcionem quando envoltos em papel alumínio. Por isso, os usuários dessa técnica de gatunagem têm usado os celulares para testar a eficiência de suas sacolas do furto. Jogam o telefone lá dentro e fazem uma ligação. Se der sinal de desligado significa que o artefato está pronto para enfrentar o sistema de alarmes.
Até cerca de dois anos, pouca gente sabia disso. Os que sabiam estavam concentrados em Brasília e algumas cidades do Nordeste, como Maceió e Natal. Mas, de repente, as propriedades bloqueadoras do papel alumínio começaram a se espalhar pelas principais cidades brasileiras na rapidez de um bom mito urbano. E em pouco tempo as grandes lojas de varejo se deram conta de que seus sistemas de monitoramento e alarme não eram páreo para o papel alumínio. “Ano passado já tivemos um aumento considerável, mas esse ano a coisa explodiu. Hoje o papel alumínio é nosso maior inimigo e a técnica de furto que mais nos causa prejuízo”, conta Edson Fortuna, diretor de Auditoria da Rede Riachuelo, uma das poucas empresas que aceita falar abertamente sobre o assunto.
O furto com bolsas de alumínio se popularizou tanto em algumas regiões do País que bolsas especialmente feitas para esse fim estão sendo comercializadas em centros de comércio popular. Em Belém, na feira próxima ao Mercado Ver o Peso, as bolsas preparadas e com garantia de funcionamento são vendidas a R$ 50 a unidade. No Rio, outra cidade que vem registrando um crescimento exponencial dos furtos com papel alumínio, as bolsas, conhecidas como sacolinhas do furto, são vendidas em Duque de Caxias. “O que impressiona é o tamanho delas. Flagramos uma com quase 100 peças na nossa loja de Osasco (Grande São Paulo). Seria um prejuízo de quase R$ 6 mil”, diz Fortuna, da Riachuelo.
Só no ano passado a Riachuelo perdeu cerca de R$ 20 milhões com furtos em suas lojas, algo como 0,75% do faturamento total da rede, que deve encerrar esse ano com 145 lojas espalhadas pelo país. “A maior parte dos furtos ainda é interna, praticada pelos nossos funcionários, mas a atuação de verdadeiras gangues têm crescido”, conta Fortuna. Para tentar se defender, a Riachuelo já investiu mais de R$ 1 milhão em um novo sistema de segurança.
São essas mesmas empresas que venderam os sistemas originais incapazes de vencer a folha de papel alumínio que agora estão lucrando com a nova demanda dos varejistas. O novo mecanismo que está sendo vendido por todas elas não resolve o problema, longe disso. Ele apenas identifica que uma pessoa entrou na loja com uma quantidade considerável de papel alumínio. “Rapidamente o circuito interno de tevê e os seguranças passam a monitorar essa pessoa de perto”, diz Adriano Sambugaro, diretor de marketing da Gateway Security, vice-líder do mercado brasileiro no segmento de segurança para empresas de varejo . O tal detector de papel alumínio encarece em até 30% o valor do sistema de alarme. Mas não há muito que os lojistas possam fazer. De acordo com as empresas de segurança, ainda não surgiu nenhum mecanismo capaz de vencer o frágil, porém poderoso, papel alumínio nessa batalha.