As primeiras imagens que registro dele são brincando de “guerrô” em volta do monumento em homenagem ao Oliveira Brito na Praça Duque de Caxias. O monumento era um obelisco em concreto tendo ao fundo um painel com azulejos com dizeres elogiando a "raça" do sertanejo. De gosto duvidoso, foi demolido pelo prefeito Joaquim da Silva Dantas para dar lugar ao bucólico jardim que fez reviver a praça.
Mas não é da praça que pretendo falar, mas daquele menino magrelo, extremamente ágil e provocante, o Bastinho de D. Edite costureira. Ele provocava os outros mais fortes confiando na facilidade que tinha em dribla-los e na extraordinária velocidade que imprimia ao corpo franzino.
Bastinho, Sebastião Ferreira Alves Santos, era filho de D. Edite e de Nesinho de Hermógenes. Este, irmão de do bem sucedido comerciante Ioiô, pai de Lazaro, de Agamenon e das meninas Marta, Guiomar e Marcinha.
Pelo lado materno, Bastinho era sobrinho de Zeca do armarinho e de outros tios cujo nome não tenho registro mas sei que migraram para São Paulo no final dos anos 40 e transformaram-se nos mais importantes comerciantes de Santo Amaro na capital paulista. Pouco letrados, porém donos de um imenso tino comercial foram os pioneiros no comércio de móveis e eletro - domésticos na região chegando a dominar o setor. Homens vitoriosos.
Bastinho fez o curso ginasial no Educandário Oliveira Brito e seguiu o caminho dos tios; São Paulo! Lá concluiu o Curso Técnico de Contabilidade e começou imediatamente a exercer a profissão mostrando-se hábil e competente.
No início dos anos 70 fui morar em São Paulo onde reencontrei o agora Sebastião já universitário e fazendo o serviço contábil de pequenas empresas. A seu convite, passamos a dividir um pequeno apartamento na Rua Herculano de Freitas na Bela Vista. Convivemos sob o mesmo teto e em alguns momentos trabalhando na mesma sala durante mais de um ano, quando tive oportunidade de observar a genialidade e a efervescência do menino nascido no número 178 da Rua da Igreja.
Entre outros episódios, lembro-me o dia em que ele adquiriu o seu primeiro automóvel. Convidou-me para acompanha-lo até a Caltabiano, revenda Ford que ficava na Rua Augusta. Enquanto o padrão de todos nós era no máximo o “Fuscão”, Sebastião resolveu comprar um Corcel GT, “verdadeira máquina”. Escolhemos o ”bólido” verde com faixas negras. Eu, motorista habilitado, ofereço-me para conduzir o automóvel até que ele tomasse aulas de direção. Qual foi a minha surpresa ao vê-lo efetuar o pagamento, tomar as chaves, abrir a porta do carona para eu entrar no carro e, aos troncos e barrancos subir a rampa que nos levava à Rua Augusta e daí sair em direção à Herculano de Freitas, raspando em postes e guias das calçadas. Era a primeira vez que dirigia um veículo.
Em 1976 Sebastião diplomou-se em Administração de Empresas pela FGV-São Paulo. Terminou o curso já cortejado por vários empresários cujos filhos foram colegas do menino euclidense e viam nele um profissional pronto para assumir cargos importantes.
Da graduação para o mestrado na própria FGV foi um pulo. O próximo passo foi ser contratado com professor titular na mesma escola que onde já lecionava Mario Henrique Simonsen e outros papas da administração e da economia. Disputado por outras instituições dedicou-se ao magistério lecionando ainda na PUC, na Metodista e na Tibiriçá.
Mas ele queria mais.Uma bolsa de estudos o levou à Universidade do Texas em Austin onde fez doutorado em Controladoria e Finanças.
Voltando ao Brasil, continuou suas atividades como professor e abriu um conceituado escritório de consultoria empresarial onde atuou até 1994 quando a convite do então governador Mário Covas, assumiu a diretoria financeira da Eletropaulo.
Fumante, nervoso, comprometido com a carreira, Sebastião era um homem que buscava sempre se superar. Provocava a vida da mesma forma como fazia quando criança com os meninos mais fortes nas brincadeiras de "guerrô".
A última vez que o vi foi em novembro de 1995 Internado no Hospital das Clínicas de São Paulo, acalentado pela sempre presente mãe, D. Edite. Magro, tossindo muito, estava consciente do grave mal que o acometera, mas continuava de pé, guerreiro, provocante, bem humorado ”É rapaz, tá feia coisa mais vou sair dessa”. Não saiu! O mal venceu o guerreiro em 27 de abril de 1996 aos 44 anos de idade.