A temperatura é um dos mais importantes fatores de
qualidade na apreciação de um vinho. Servido demasiado quente ou demasiado frio
pode ficar irremediavelmente comprometido o seu desempenho à nossa mesa. Nestes
dias de calor há de se estar bem atento ao termômetro e, principalmente não ir
naquela cantiga do "tinto à temperatura ambiente".
O verão aí está com as suas altas temperaturas. Há que
escolher uma sombra, uma sala com ar-condicionado, ter cuidados com o sol,
comer comidas leves e beber bebidas frescas. E quanto ao vinho?...
"O branco fresco e o tinto à temperatura
ambiente". Este é ainda o lugar comum do serviço de vinhos. Maior asneira
é difícil de encontrar. A interpretação à letra desta regra leva a cometer
atrocidades um pouco por todo o lado onde o vinho é consumido. Contou-me um
amigo que, em viagem pelo Nordeste, lhe fora servido num restaurante um tinto à
singela temperatura de 35ºC. O dito amigo costuma fazer-se acompanhar por um
pequeno termômetro pendurado no bolso da camisa. Assim que o vinho lhe caiu no
copo, naquele dia de extremo calor, sacou a peça que mergulhou no líquido
escuro e ficou a observar, sem surpresa, a coluna de mercúrio subir até o
número 35. Como o tinto é servido à temperatura ambiente, aí estava um vinho
que de tão quente que estava o ambiente, só lhe faltou aquecê-lo.
Recordo-me também, que há algum tempo almocei nas
instalações de uma prestigiada e muito conhecida casa produtora de vinhos em
Portugal. No meio de toda a formalidade de serviço da refeição, o branco chegou
fresco com as paredes do cálice ficando de imediato cobertas de pequenas gotas
de água e o tinto à temperatura ambiente. Não chego ao rigor do meu amigo e não
costumo viajar de termômetro no bolso, mas calculei para mim mesmo que aquele
tinto deveria andar pelos 25º de temperatura.
A seguir veio um Porto que, tal como é a tradição, foi
servido em decanter para que os comensais lhe adivinhassem a categoria, origem
e data da colheita. Devo confessar que apesar de apreciar este "jogo"
de final de refeição (que mais não seja por ter espírito esportivo) naquele
preciso momento não achei nenhuma graça na brincadeira. Tal como o tinto, vinha
à temperatura ambiente.
Apesar da enorme falta a que o seu serviço era submetido, apresentava qualidade, mas no aroma o álcool atiçado pela alta temperatura sobrepunha-se às nobres essências de fruto e, na boca, uma vez mais, este elemento tornava a prova pesada e desinteressante. Em vez de elegância e sutileza que um vintage velho deve apresentar, apareceu a brutalidade e caráter boçal de um vinho demasiado alcoólico, muito doce e desequilibrado. Poderia escrever dez páginas com mais exemplos, mas penso que estes já chegam para expor o assunto em discussão.
O valor absoluto dos termos "fresco" e
"temperatura ambiente" variam enormemente ao longo do ano. Aquilo que
pode parecer quente no inverno parece-nos fresco no verão e vice-versa.
Esta enorme variação de temperatura que no Norte/Nordeste
pode atingir algumas dezenas de graus centígrados torna extremamente relativos
os termos da absurda regra, anteriormente referida. Por todo cuidado,Baco agradeçe!