Eles são quatro homens com atividades profissionais distintas e estilos de vida próprios. Raimundo Bentes é músico, Ricardo Brasileiro, fotógrafo, Thiago Fontenelle Brasileiro, arquiteto urbanista, e Orlando Maia, corretor de imóveis. Entre eles, existe algo em comum: o interesse pela prática da ioga. Todos freqüentam assiduamente as aulas do Espaço Mahatma Gandhi, no bairro da Pituba, em Salvador.
Esses homens engrossam um público masculino cada vez mais presente em diversos centros de ioga brasileiros, uma tendência crescente nos últimos cinco anos nos países ocidentais. Centros como o Mahatman Gandhi já abrigam em seu salão quase 30% de homens, distribuídos na faixa etária dos 16 aos 70 anos.
São estudantes, profissionais liberais, professores universitários, empresários e aposentados que encontram ali um espaço acolhedor, preparado holísticamente para afastar as agonias da cidade grande e ao mesmo tempo promover a energização corporal e a tranqüilidade mental. O ambiente cuidadosamente decorado com plantas, aquários e cores tranqüilizadoras, embalado pelo som de músicas relaxantes e perfumado pelo aroma dos incensos, por incrível que pareça, atrai e estimula os alunos. Assim, eles realizam a meditação, relaxamento e acompanham os exercícios de flexibilização, alongamento, resistência, respiração e de equilíbrio corporal, promovidos pelas tradicionais posições do hatha yoga.
No corre-corre diário dos ensaios da banda Araketu, o saxofonista Raimundo Bentes sempre arranja tempo para fazer as aulas de ioga. Sua inclinação pela atividade começou pelo menos há 20 anos, em Fortaleza. Aliado a isso, ele adota um o estilo zen, ao optar pela alimentação natural, não fumar e raramente utilizar bebida alcoólica.
"Quando eu entro naquela sala, a sensação que me dá é de que estou num oásis, tamanha é a paz que eu sinto. É um momento de introspecção, voltado para mim mesmo, necessário em qualquer hora do dia", disse Bentes. Há pelo menos três anos, ele freqüenta o Mahatma, junto com a mulher, a professora de canto, Suely Sodré, convencida por ele a praticar ioga. "Um dá força ao outro. Quando não vamos à ioga sentimos que está faltando algo", conta Suely com ar de cumplicidade.
Para Bentes, a ioga serve como "válvula de escape", fazendo com que se desligue da movimentação do cotidiano exigida pela atividade profissional, incentivada pelo sobe-e-desce do avião e o contato nos shows com a multidão. Os exercícios praticados também são grandes auxiliares para a realização de uma respiração adequada, necessária na utilização do sax.
SÍNDROME DE PÂNICO – A Síndrome de Pânico que sofreu no ano passado motivou Ricardo Brasileiro a entrar para as aulas de ioga. Tinha simpatia pela atividade por afinidade aos movimentos holísticos e à cultura oriental, mas a recomendação médica agilizou sua decisão de fazer a atividade. Os resultados foram surpreendentes no combate à doença. Com um mês de aula, Ricardo já havia sido liberado dos medicamentos ansiolíticos, diferentemente de outros acometidos pela Síndrome, que muitas vezes tornam-se dependentes dos medicamentos. "Descobri que a ioga é muito mais do que um auxílio ao tratamento, mas recurso principal dele", diz animado, afirmando que fará ioga "até o final da vida".
Conciliando com a atividade fotográfica, ele freqüenta as aulas quatro vezes por semana, praticando inclusive duas vezes por dia. Após seis meses de ioga, o fotógrafo diz ter superado a doença, sente-se mais concentrado e equilibrado emocionalmente, livrou-se da insônia e reduziu a ansiedade, passou a adquirir uma vida mais saudável e contraiu equilíbrio energético. "Com a ioga passei a viver o presente. Estou me tornando um zen-budista", diz ele, contando que já enfrentou gozação dos colegas por praticar ioga, mas que encara tudo na brincadeira.
Ricardo ficou tão entusiasmado com a nova atividade, que arrastou vários amigos ao Mahatma Gandhi. Entre eles, o primo Tiago Brasileiro. Desde pequeno, o arquiteto ouvia os pais, então praticantes de ioga, falarem dos seus benefícios, mas nunca manifestou vontade de freqüentar as aulas.
Ao ler no ano passado sobre a arte milenar, o arquiteto começou a praticar os exercícios em casa. Em determinado momento, sentiu necessidade da interferência de um instrutor e atendeu ao conselho do primo Ricardo. Largou a capoeira que fazia e, atualmente, dedica-se à ioga, pelo menos duas vezes por semana.
Thiago não tem dificuldades de fazer os movimentos, seguindo corretamente as posições manifestadas pela instrutora. Ao terminar as aulas, tem a preocupação de questionar sobre dúvidas ou reações que tenham ocorrido. Em casa, também realiza os exercícios e continua fazendo as pesquisas teóricas.
Neste empenho, ele tem colhido bons resultados físico e mental, melhorado a postura corporal, adquirido um sono mais tranqüilo e a fluidez na respiração, imprimindo um ritmo mais equilibrado para enfrentar o cotidiano dos trabalhos profissionais. "Comecei na ioga para reeducar a postura física e o estado mental, para depois trabalhar o plano espiritual", comenta, ressaltando que só falta às aulas em caso de trabalho ou doença.
Nova visão – Já Orlando Maia mudou totalmente a sua impressão sobre ioga depois que participou de uma aula experimental, motivado pela mulher, Maria dos Reis. Pensava que se tratava de uma atividade monótona. Mas gostou logo. "Achava que fazer ioga era ficar como aquelas pessoas que passam horas em frente ao mar de pernas cruzadas. Não é nada disso. Os exercícios são puxados, às vezes", disse ele.
Ele só troca as aulas de ioga por uma partida decisiva do Bahia, time do coração. O casal sai direto do trabalho na imobiliária para relaxar nos salões do Mahatma. "Pensei que ele não ia se adaptar, mas foi surpreendente", acrescentou a mulher, lembrando que eles percorreram várias academias de ginástica, mas que se afinaram com a ioga.
O corretor se considera "meio duro" para desenvolver os movimentos, mas garante está acompanhando as aulas, o que vem favorecendo resultados satisfatórios no corpo e mente. O combate ao estresse, proveniente de sua atividade profissional, tem sido um dos principais benefícios adquiridos. "Estou bem melhor, dormindo bem, mais tranqüilo, respirando com facilidade, para enfrentar o dia-a-dia do trabalho", confirmou Maia, revelando que, em paralelo, tem optado por uma vida mais saudável, alimentando-se de comidas mais leves e utilizando bebida alcoólica em menor quantidade
A realidade brasileira não condiz com a oriental, onde se verifica a maior freqüência do sexo masculino praticando ioga. Afinal, foram as figuras masculinas as grandes incentivadoras da prática corporal há mais de cinco mil anos na Índia.
Os motivos que levam os homens ocidentais a tomarem a decisão de se matricular na ioga variam por idade. Geralmente, os rapazes entre 16 e 25 anos têm necessidade de atender a uma curiosidade e de abrir-se ao autoconhecimento. Enquanto aqueles acima desta faixa etária recorrem à atividade como ajuda terapêutica, tendo como principais queixas problemas na coluna, estresse, síndrome de pânico, depressão, dificuldade no sono, hipertensão e ansiedade.
De acordo com a terapeuta psicocorporal Ludmila Hohr, diretora e instrutora de ioga do Espaço Mahatman Gandhi, a predisposição da ala masculina para a ioga deve-se ao novo tratamento dado pela mídia a essa atividade corporal, não a encarando tradicionalmente como uma filosofia voltada exclusivamente à meditação. Segundo ela, a prática da ioga vem sendo mostrada como uma opção de movimento integral do corpo, abrangendo os planos espiritual, mental e físico, sendo associada ao bem-estar, saúde, beleza, energização, postura corporal, equilíbrio emocional e autoconhecimento.
"Nessa concepção é que os homens optam pela ioga, na busca de uma atividade diferente das academias de ginásticas, menos desgastante, mais exótica e que proporciona um sentido maior à vida, que o simples movimentar-se", afirmou a terapeuta. E, o que é muito importante para eles, segundo ela: libertar-se do espírito de competitividade tão evidente nesse gênero. "Eles sentem-se mais à vontade e tranqüilos, pois saem do padrão da competitividade, não precisando provar que é melhor, produzindo isto um grande alívio", complementa.
Nos primeiros dias de aula, alguns se apresentam rígidos e até mesmo inibidos. De acordo com Ludmila, as dificuldades que podem surgir no decorrer dos movimentos podem ser encaradas, inicialmente, como empecilhos, que vão sendo vencidos aos poucos. Outros já as enfrentam como desafio necessário ao crescimento. "Os homens perceberam que ioga não é apenas ficar parado, em meditação, significa muito mais. Eles experimentam um trabalho corporal integral, e sentem os resultados, individualmente, a cada aula que participam, enfrentando com mais energia a sua rotina", disse Ludmila.
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Ricardo Brasileiro, fotógrafo
Thiago Fontenelle Brasileiro, arquiteto urbanista. Os dois são primos e adeptos da Ioga
Os corretores Orlando Maia e Maria Reis São novos adeptos
Ludmila Rohr é instrutura e terapeuta psico corporal
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