Já me disseram que o carnaval foi criado como escape do povo sofrido.
Durante um pequeno período de tempo era permitido aos pobres brincar...imitando os achaques bizarros e os olhares de desdém de seus senhores...
de nobreza, fantasiando-se de rainhas, de príncipes e de rei Momo,
colocando perucas, agitando leques - com ou sem navalhas escondidas...
Um revide de mentirinha orquestrado pela aristocracia
interessada em avaliar o humor do povo, permitindo à plebe durante três
dias todo tipo de maluquices, bagunça e estripulias, a fim de acalmá-la por
mais um ano...
Na Alemanha, locomotiva da economia da Europa, ao contrário
do que muitos pensam, o carnaval começa bem mais cedo do que no
Brasil.Em várias cidades alemãs, no dia 11 do 11 (novembro),
pontualmente às 11horas e 11 minutos começam os festejos momescos... com
um desfile, cuja duração geralmente não ultrapassa o tempo de
uma partida de futebol. Logo depois, todo mundo volta ao batente.
Os demais eventos carnavalescos nas ruas, em pistas de
esqui, estádios de gelo e principalmente nos salões, com gente trajada a
rigor, dançandovalsa com passos cruzados à esquerda, ou vestindo roupa típica, ao som de polcas e "Landlers",
acontecem nos fins de semana.
O povo se diverte, com cada um aprontando à sua maneira, com
ou sem fantasia, com ou sem máscara... porém sem deixar a peteca
cair.Ninguém interrompe a produção. Nem a caldeira daquela
locomotiva potente chega a esfriar...
Antes, durante e depois dos festejos momescos, tanto na
Alemanha, na Áustria ou em outro país da Europa, eventuais episódios de
desordem pública são resolvidos pelo guarda mais próximo.É o lado do assim chamado Primeiro Mundo, que nós costumamos
curtir,admirando a limpeza das ruas, dos calçadões e dos sanitários públicos,a pontualidade do transporte público, dos lojistas ao abrir
e fechar as portas de seus estabelecimentos... e quem sabe, invejando um
pouco a ordem que fomenta a economia daqueles países.
Enquanto isso, em pleno outono, aqui em Salvador ainda não
nos livramos por completo dos foliões, nem das más línguas, dizendo que
por estas plagas o carnaval dura cinco dias... além de um período de
pré-, outro de pós-carnaval. Cada um dos dois períodos com duração de 180
dias...Enquanto isso, a folia continua, dia e noite, turistas
farofeiros sujando praias e ruas, urinando em
via pública, sem ninguém responsável para coibir essa baderna.
Pois é, até o turista estrangeiro, que na terra dele jamais
jogou uma baga de cigarro ou um
papelucho no chão, jamais atravessou a rua fora da faixa de pedestres, num instante aprende a transgredir com os eternos
foliões locais.Isso mostra que esses forasteiros - ao contrário que muitos
pensam - não são educados coisa nenhuma e sim apenas adestrados, mantidos em
xeque permanente pelo medo de serem multados... de levarem uma
reprimenda.Como nesta terra não há multas, nem repressão qualquer por
parte de quem deveria combater até as pequenas infrações - embriões da
violência - e até crimes ambientais como a poluição sonora, esses turistas
tipo "fusquinha"devem sentir-se como pinto no lixo... irmanados com nossos
"capitães de areia",enrolados com meninas e meninos de programa.
Será que um dia a gente conseguirá fazer com que o Rei Momo
devolva a chave da cidade?Será que a gente conseguirá fazer com que o carnaval acabe
na quarta feira de cinzas? Será que um dia os pobres foliões se fartarão de suas
travessuras, aceitando limpeza e ordem, a fim de que a cidade possa ter o valor que
merece... por suas belezas naturais e arquitetônicas e pelas pessoas de
bem que aqui habitam, trabalham e pagam impostos?
No dia que isso acontecer, Salvador, mais precisamente a
Barra, se tornará um St. Tropez com um grande número de lojas boas,
restaurantinhos e bares transadinhos à beira mar e hotéis de luxo para os moradores
do bairro e turistas bons, bem melhores do que os que atualmente vem para cá...
usando Salvador apenas como escape da vida medíocre, como cenário de
aventuras eróticas baratas.
Enquanto Salvador - com um pouco de ordem, algumas cestas de
lixo decentes e uns dois sanitários públicos - tem condições em transformar-se num St. Tropez,St. Tropez, com
um verão que dura apenas de junho a setembro e cujas praias tem areia escura e grossa, parecendo pó de pedra, jamais
poderá ser como Salvador.
Além disso não há em todo St. Tropez nenhuma taverna gostosa
como o Bistrô PortoSol,
nem taverneiro tão simpático e modesto quanto o
sujeito que acaba de escrever esta baboseira.
Autor: Reinhard Lackinger Publicação vista 2717 vezes
Existe 1 comentário para esta publicação
sábado, 4/4/2009 por Reinhard Lackinger Ainda é Carnaval Cidade
Não há comentários a fazer. As fotos colocadas por meu amigo Celso valem mais do que mil textos.