Ando me divertindo em Sertãozinho do Tietê, plantada em seus 1.270 metros de altitude, no lado paulista da Serra da Mantiqueira, com a experiência caseira de produção de licores. Mata o tempo, aguça a curiosidade, amplia conhecimentos, e o produto final tem cor, odor e sabor. Nada mal.
Como é uma brincadeira lenta e demorada, nada mais gratificante do que chegar e abrir os corotes de amendoinzeiro para saber como as coisas andam. Se o álcool está interagindo com as frutas nele imersas, por exemplo. Aguça a imaginação especular sobre iguarias que podem agregar qualidades ao produto final, bem como, mais a frente, a escolha de garrafas, rótulos e outros adereços que enobreçam esta alquimia amadora.
Como a graça maior está na experimentação, me ocorreu perguntar a dona Angelina, uma anciã nativa da terra, e um doce de pessoa, quais os frutos típicos da região. Comecei pela gabiroba.
- Ah, não tem mais. Tinha muito no pasto. Uma árvore grande. A gente comia as gabirobas amarelinhas que caiam, mas não tem mais.
Contou-me que as árvores cederam aos machados, para dar lugar aos eucaliptos.
Não desisti e perguntei pelos araçás.
- Tinha muito, Rogério, mas não tem mais.
Também com os araçás, machados e motosserras fizeram trabalho perfeito para abrir espaço aos eucaliptos.
A resposta não foi diferente para pitanga, baúna, uvaia, laranja azeda, cidra, jambo, jaca, ingá, jataí, morango silvestre e goiaba. Não escapou nem mesmo a banana.
- Ah, um ou outro tem um pé, mas no mato não tem mais. Agora, concluiu dona Angelina para por fim na conversa, só na quitanda.
Acabaram com as frutíferas que brotavam ao acaso nos campos, e se tornaram reféns da quitanda. Soube por ela, entretanto, que às vezes compram mudas em viveiros, não raro das mesmas espécies espontâneas que erradicaram, embora prefiram as de fora, isto é, as frutíferas da moda.
Agora entendo porque ela, e outras pessoas da cidade que visitam minha casinha, ficam surpresas e encantadas com a goiabeira, pitangueira, parreira e o maracujazeiro que plantei em meu pequeno quintal, assim como roseira, quaresmeira e primavera. De fato, nos terrenos das casas próximas, reina o cimento e o mato. Ninguém planta mais nada. Nem para o gasto. Dá trabalho, pois precisa cuidar.
Bem, não posso dizer o mesmo do quintal do Roque, meu amigo e vizinho, todo ele tomado por ramas de chuchu, que já se apoderaram da única laranjeira e do único pé de acerola de seu lote, além dos muros e telhados próximos, para desespero dos vizinhos, inclusive eu. Bem, mas o Roque é o Roque.
De certo modo, agora entendo, também, por que Sertãozinho do Tietê é tão pobre de cores, sabores e odores, inclusive nos relacionamentos sociais. Como os eucaliptos, tornaram-se todos assemelhados, inclusive na capacidade de impedir surgimento e cria de novas e variadas formas de vida.
Como ficou matutando sobre minhas perguntas, veio dizer-me dona Angelina, neste instante, que talvez isso explique porque sumiram tantos animais da região, inclusive o saá.
Frustrado, mas ainda pensando em aproveitar os frutos da terra, estou em dúvida quanto à possibilidade de fazer licor de eucalipto.
Alguém sabe dizer?