Cena um. Uma propaganda da Gilette
Ele dá uma olhada no banheiro e, para sua alegria, encontra o aparelho no box do chuveiro, o que faz os lutadores irem embora. Missão cumprida. Na saída da casa, eles se dirigem à esposa com a frase: “também estamos de olho em você”.
Cena dois. Um print screen de um zé-ninguém na
internet, comentando num dos blogs feministas mais acessados darede
Essas duas situações recentes me lembraram de algo em que já vinha reparando há tempos. Cada vez mais, nos círculos sociais que frequento, me convenço de que o maior desafio do feminismo hoje não somos nós, mulheres: são os homens.
Não sei há quanto tempo sou feminista. O feminismo veio com a minha vida, numa família em que eu e meu irmãos fomos criados em condições iguais; em que meus pais dividiam o trabalho doméstico e as tarefas de cuidado com os filhos. O feminismo começa aí: no cotidiano. O feminismo começa na maior ou menor disposição pra enfrentar uma pilha de louça suja, ou na aceitação e na recusa em se delegar 100% das tarefas à faxineira que vem uma vez por semana. O feminismo é a intolerância com a roupa que precisa ser lavada, com o lixo que precisa ir pra fora. A vontade de cozinhar. A fralda de cocô. O aleitamento de madrugada.
Praticamente todas as mulheres que conheço têm uma espécie de espírito independente, protagonista. Enxergam questões que precisam ser resolvidas e não esperam que alguém as resolva; tomam a iniciativa. Isso vale pras tarefas que mencionei, mas vale também para situações de trabalho, para relacionamentos, para o jogo de sedução, para todas as esferas da vida. Não vejo o mesmo acontecer com a maioria dos homens (embora haja exceções, claro, e sou feliz de dividir uma vida com uma delas).
Os homens ainda parecem ter uma experiência de gênero mais conservadora; é quase como se o feminismo tivesse até aqui conseguido mudar muito as mulheres e quase nada os homens. Os homens, ao contrário do que algumas companheira feministas defendem, não são verdadeiros bananas. Em geral, eles são é muito pró-ativos, independentes, protagonistas. O problema é que essa atitude toda costuma ficar restrita à carreira, ao ambiente profissional. É como se eles se transformassem ao chegarem em casa. Da porta pra dentro, grande parte deles se comporta como a criança que já foram um dia.
Infelizmente não sei explicar de forma exata por que isto acontece. Eu diria que depende dos modelos de gênero que a pessoa teve. Isso significa que depende da forma como os papéis sociais eram distribuídos na família, mas também em outros espaços. Me lembro, por exemplo, do tanto de autonomia que ganhei participando do movimento escoteiro quando criança e adolescente, que foi o mesmo para meus colegas homens. Quando era preciso cozinhar, limpar os espaços, carregar bambus pesados, etc. tive a sorte de estar num grupo escoteiro onde era tudo muito igualitário. Igualitário até demais para algumas das minhas amigas – que queriam mesmo era que alguém matasse a barata que tinha entrado na barraca durante um acampamento, ao invés de enfrentarem o medo. Por outro lado, quem matava as tais baratas muitas vezes eram outras meninas. O negócio ali era criar uma vontade de independência em todo mundo, de todos os gêneros, para todo tipo de tarefa.
Esta é a saída que eu vejo, hoje, para resolver esse impasse que acaba pesando mais nas costas das mulheres (que, sendo pró-ativas em tudo, acabam fazendo tudo mesmo): que as propagandas, programas de tevê, novelas, filmes, familiares, irmãs, mães, pais, avós, escolas, professores, babás, faxineiras, gerentes executivos, enfim, que nós todos e todas, como sociedade, simplesmente nos recusemos a tratar os homens como idiotas. Não é tão difícil assim. Basta tratar um homem adulto como aquilo que ele é: um homem adulto.