Para além de seu pioneirismo e de sua maestria técnica, o que mais chamava a atenção de quem se aproximava dele era o seu intenso calor humano, seu entusiasmo pela vida, sua curiosidade infinita pelas coisas do mundo. Ninguém saía inalterado do contato com esse homem.
Tive o privilégio de ser seu aluno no curso de jornalismo da ECA-USP, na disciplina fotojornalismo. Sua aula consistia em levar os alunos numa Kombi a algum lugar da cidade e entregar uma câmera a cada um, dizendo-lhes que fotografassem algum tema em particular. Claro que ele dava algumas orientações gerais, mas deixava a cargo de cada aluno a escolha de seu objeto e o modo de se enfrentar com ele.
Lembro-me, por exemplo, de uma manhã em que fomos ao largo de Pinheiros. O tema era “profissões”, e então nos espalhamos pelo largo e seus arredores, fotografando jornaleiros, vendedores, policiais, barbeiros, ambulantes, manicures, todos eles no exercício de seu ofício.
Uma das poucas dicas de Farkas foi a seguinte: para que o fotografado não posasse para a foto, perdendo a naturalidade, devíamos aprontar a câmera (abertura, velocidade, foco etc.) apontando-a para outro objeto, que estivesse na mesma distância e mais ou menos com a mesma luz do fotografado. Só depois de tudo pronto apontaríamos a câmera para nosso personagem, pegando-o de surpresa.
Guardo até hoje algumas das fotos que fiz naquela longínqua manhã.
Depois disso, no exercício da minha profissão, encontrei um punhado de vezes com Thomaz Farkas. Sempre o chamei de “professor”, não apenas por hábito, mas porque era isso mesmo o que ele era: um professor de fotografia e cinema, mas principalmente um professor de elegância, gentileza, afeto fraterno. Dói um bocado saber que não vou mais encontrá-lo por aí, com seu bigodão e seu sorriso jovial.
Farkas registrou de tudo em seus filmes e fotos, mas dois universos em especial lhe eram muito caros: a música popular (tem um belíssimo curta sobre Hermeto Paschoal, por exemplo) e o futebol.
Para celebrar a passagem tão bonita e fecunda do mestre por nossas vidas, aqui vai o curta de Ricardo Dias em que Farkas apresenta o filme que fez da apresentação de Pixinguinha e seu grupo na inauguração do Parque do Ibirapuera, em 1954. São imagens de um valor inestimável. Não são para ver de joelhos, como se costuma dizer, mas para ver dançando.