Salvador é um pouco disso, mas é muito mais, é uma terra que recebe o turista de braços abertos, com afeto e muita satisfação. Esse sim é o principal cartão de visita, o motivo que alimenta uma vontade imensa, aquela de voltar mais uma vez. Nesta reportagem, conheça um roteiro muito particular da capital da magia e algumas personalidades que são a “cara” da cidade.
Conheci Salvador em 1980, quando ainda fazia faculdade e durante os cinco dias em que participei de um seminário – envolvida em debates e discussões, claro que não deu para visitar quase nada. O Mercado Modelo, a antiga e badalada boate Regine’s, o Farol da Barra e o Pelourinho foram, apenas, algumas das opções oferecidas durante essa pequena viagem. Na verdade eu nem sabia que deixava para trás o principal: o contato mais íntimo com o povo baiano, com essa gente, porque não dizer, diferente, viveria uma série de surpresas. A capital da Bahia que descobri, agora, é outra. Fiz, durante três dias, uma excursão acompanhada por um guia Agora de volta, depois de tanto tempo, já tinha sido avisada de que dispensa apresentações. O fotógrafo Valtério Pacheco, conhecido nos quatro cantos de Salvador, gentilmente deixou tudo que tinha por fazer para apresentar, cheio de orgulho e satisfação, a sua terra. E Valtério não exagerou em nada, confirmei tudo e me surpreendi muito mais do que imaginava.
Salvador tem realmente algo mágico. Todo esse mistério é creditado às crenças, a um sincretismo religioso que aflora a cada instante. Mas não é só isso, não. Quando comecei o meu passeio/trabalho, percebi que, só pela forma como ia sendo recebida pelas pessoas, com uma simpatia sem igual e boa vontade que excedem a um simples seja bem-vinda, a impressão seria a melhor. Já no aeroporto, alguém não perdeu tempo: “A Bahia é sua”. A partir daí, percebi que o baiano tenta e consegue ser um brasileiro peculiar.
Bênção do Bonfim – A primeira parada foi na Basílica do Senhor do Bonfim, para pedir boa estada, agradecer a excelente viagem e fazer, como rezam a tradição e superstição, três pedidos quando se visita uma igreja pela primeira vez. Logo na entrada, uma coleção de vendedores ambulantes que oferecem colares e fitinhas do Bonfim. Quem vai à Bahia e não vai ao Bonfim não visitou Salvador como deveria. Tanto na fachada quanto em seu interior, a igreja é linda e impressiona. A madeira talhada, em tom dourado, dá aquele ar de suntuosidade. Ao lado do altar principal, a Sala dos Milagres, conhecida em Salvador como Museu dos Ex-Votos, onde os devotos depositam suas gratidões.
A igreja é uma das 365 que, segundo o poeta, abençoam a cidade todos os dias. É comum assistir, logo na primeira fila, um momento de devoção. Dona Abigail Lordelo é uma daquelas beatas do Bonfim que adoram um papo. Simpática, ainda em plena atividade profissional, apesar dos 76 anos, continua exercendo a advocacia. Ela confessa que tem uma promessa para pagar e, por esse motivo, reza o terço com tamanho fervor.
Logo abaixo da igreja do Bonfim, um pouco mais de história. Salvador é protegida por fortes por todos os lados. É lá que ficam em exposição canhões centenários, na colina do Mont Serrat. Para manter a tradição, diariamente, ao meio-dia, é dado um tiro. No local também funciona um museu. Uma bela vista da cidade pode ser observada do Humaitá quando, em um movimento a contraluz, avista-se um mar sem fim. Se olhar para cima, mais um monumento histórico: a igreja de Santo Antônio Além do Carmo. Enquanto fotografa, Valtério Pacheco fala sobre a igreja. Diz que em 1624, durante a invasão holandesa, uma das torres não suportou um tiro de canhão. Para que o povo baiano não esquecesse a façanha de ter expulsado os invasores, uma lembrança: a igreja permanece, até hoje, com uma só torre.
Contrastes sociais – A cidade é cheia de contrastes, e as diferenças – tanto sociais como culturais – vão aflorando nitidamente. É conhecido como Corredor da Vitória um conjunto de edifícios, de frente para o mar, que são dotados de elevadores periféricos e ancoradouros particulares para embarcações. O tradicional Mercado Modelo fica na Cidade Baixa. É lá que o turista encontra logo na entrada, do delicioso acarajé às telas que pintam e desenham as belezas imaginadas por artistas locais. Andando um pouco mais, surge o Elevador Lacerda, inaugurado em 1873, famoso cartão postal da Bahia. Fica na Praça Cayru e funciona das 5 horas à meia-noite. Ele faz a ligação com a Praça Municipal, na parte alta da cidade. As cabines são centenárias e por apenas alguns centavos é feita a travessia.
Atrás do Mercado Modelo, fica o Centro Náutico da Bahia, também conhecido como Terminal Turístico Marítimo. Desse local, saem lanchas e escunas que fazem o transporte de passageiros para a Ilha de Itaparica, Morro de São Paulo e passeios pela Baía de Todos os Santos. No porto de Salvador, o ritmo é acelerado. Fica fácil observar o entra e sai de mercadorias que abastecem a feira de São Joaquim, oriundas do Recôncavo Baiano, e também, as que saem do Pólo Petroquímico com destino aos mercados estrangeiros. A área é conhecida como Comércio.
Nas proximidades, está a igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, a padroeira da cidade. E visitar Salvador sem conhecê-la, é um pecado. Nela está o jazigo da Irmã Dulce, e de lá sai a procissão, em janeiro, quando as baianas se reúnem para fazer a lavagem das escadarias da basílica do Bonfim. A festa é tradicional e carrega um mundo de gente famosa que participa para receber bênçãos por todo o ano.
Os orixás – Próximo cartão postal, o Dique do Tororó, que foi batizado com o nome do bairro e sugere um pouco mais de tempo para apreciar a arte de Tati Moreno, que idealizou cada escultura. São os orixás Oxalá, Xangô, Oxum, Iansã, Ogum, Yemanjá, Nana e Logum e Dá, que também representam os dias da semana. Há um ano, o dique foi reformado e, à noite, é lugar ideal para namorados e para quem deseja ficar em forma. Virou point para caminhadas e passeios de pedalinho. À noite, as esculturas ficam iluminadas. Em volta do dique, em um dos lados, está sendo construída a “nova” Fonte Nova, onde os torcedores do Bahia se esbaldam em dia de jogo.
A disposição para o bem-estar na Bahia é visível. Esse povo tem um ritmo diferente, que talvez seja o principal motivo para a alegria fazer a sua morada nessa terra de grandes festas, tanto sagradas como profanas. O chamado circuito Barra - Ondina faz a alegria do povo, principalmente no Carnaval. Todos os caminhos levam ao prazer e aos encantos da Bahia, cantados em verso e prosa por Dorival Caymmi, Vinícius de Moraes, Caetano Velloso, Gilberto Gil e muitos outros poetas famosos ou não.
Totalmente voltada para o turismo, Salvador é uma cidade que conta com uma rede hoteleira e infra-estrutura para todos os gostos e bolsos. Já no momento dedicado ao café da manhã, começa a inspiração. É como se fosse um passeio por Rio Vermelho, Ondina, chegando até o Farol da Barra. Em Salvador, é comum encontrar hotéis lotados. No Othon Palace, o café da manhã também é cinco estrelas e recheado com os quitutes que só mesmo a Bahia pode e sabe oferecer. O Othon fica justamente na área conhecida como a dos hotéis, o bairro Ondina.
Além da imensa quantidade de bons restaurantes de comida típica baiana, é indispensável uma visita ao Alfredo di Roma em Ondina. Excelente opção para os apaixonados por comida italiana, mas o cardápio não se restringe, apenas, a massas. Nas paredes, quadros com Marília Pêra, Gal Costa, Fafá de Belém e muitos outros famosos que posam fazendo mil e uma brincadeiras com o prato mais pedido: o fettuccine all’ Alfredo. A tradição de fotografar os vips é antiga. A máquina está sempre pronta para o clik. Essa é a terceira geração do tradicional restaurante que surgiu em Roma, na Itália, em 1910, inaugurado por Alfredo Di Lélio. A fama correu mundo e chegou até com área para jardins em seu interior. Mas se engana quem acha que vai encontrar um a Cidade do México, Santiago, Orlando e Rio de Janeiro. O restaurante tem capacidade para 100 pessoas. É considerado top e, nos fins de semana, tamanha a procura, as reservas são aceitas até as 21h30. A arquiteta Maria Clara Mesquita cuidou da decoração confortável, aconchegante com estilo de cantina sofisticada italiana. O Afredo di Roma é sofisticado como o seu cardápio, idealizado pelo chef Nailton Ribeiro, um baiano que se aperfeiçoou na Itália. O maitre-somelier Marcelo não conta o segredo, mas adianta que o autêntico fettuccine, receita do Alfredo, é feito à base de exclusiva manteiga cremosa, sem sal, e queijo parmesão, que tem que ser italiano, é claro.