Num artigo publicado na edição de Natal do
"British Medical Journal", o especialista revela que, nos últimos 219
anos, já foram diagnosticadas ao músico 140 doenças e 27 perturbações
psicológicas. Relança assim o debate em torno da medicina histórica: continua a
ser pouco precisa e enviesada, com uma seleção questionável de fontes.
A nova tese de Karkausen é que Mozart tem sido alvo de uma campanha de
difamação. "Este fenômeno é a nemesis médica de Mozart. Esconde a intenção
secreta de tirar um autor excepcional do seu pedestal em consequência de uma
necessidade obscura de baixar a crista aos grandes artistas", defende. De
que morreu então o compositor? "A causa mais plausível terá sido uma
epidemia. Pode ter sido gripe ou tifo. Quem sabe?", As duas causas foram
propostas pelos médicos do compositor e para o especialista são as mais
realistas. Mas há outro pormenor relevante, referido pela cunhada de Mozart,
Sophie Haibel, adianta. "Na altura era uma terapia aceite sangrar as pessoas com doenças infecciosas. Sabemos que ele perdeu cerca de dois litros de
sangue em duas semanas. Esses sangramentos teriam sido um fator determinante
para a sua morte."
Na lista de 140 doenças assinada por Karkausen entram sífilis, malária ou
meningite, quadros raros como púrpura de Henoch-Schönlein (uma inflamação dos
vasos sanguíneos) ou obesidade. O médico nota ainda que, quanto mais recentes
menos verossímeis são os diagnósticos, além de haver uma estranha ligação entre
a especialidade dos médicos que se aventuraram nos anais da morte de Mozart e as
causas propostas. No século passado, o microbiologista R. Schoental sugeriu o
envenenamento com fungos e o farmacêutico R. Ludewig falou de vinho contaminado
com chumbo, hipótese válida tanto para homicídio como para suicídio. A tese de
homicídio é partilhada pelos discípulos e por alguns musicólogos, que apontaram
o dedo aos judeus, à maçonaria e aos jesuítas.
O interesse pela saúde de Mozart, conta Karkausen, surgiu depois de ler um
trabalho na revista "Musical Times" onde o compositor era apresentado
como maníaco-depressivo. "Quando acabei de ler os dois artigos concluí que
era impossível. Durante dois ou três anos estudei a literatura, estive na
Fundação Mozart em Salzburgo e no fim percebi que sabia muito mais sobre as
fontes originais do que tem sido reproduzido." Além da lista de doenças,
disponível no blog Mozart and Medicine, a dedicação valeu-lhe conclusões
originais. "Fiz uma análiseepidemiológica da morbilidade de Mozart - ou
seja, da incidência de doenças graves - e a frequência é comparável à da de uma
criança ocidental no século xx." Dizer que o compositor era louco, a
imagem reforçada pela história, também é mera especulação. Karkausen põe as
mãos no fogo: "Se alguma vez na história da música houve um músico
mentalmente saudável foi sem sombra de dúvida Mozart."