Mas também alguns países mais pobres, como a China, lançaram grandes planos de plantio de florestas com o objetivo de prevenir desastres naturais, consequências do desmatamento. Mesmo nos países tropicais, onde o maior número de desmatamentos ocorre, o Brasil e outros resistem às investidas de desmatamento por madeireiras e agricultores.
Pelo menos durante os últimos dez mil anos, desde que o gelo derreteu e as florestas voltaram a cobrir a terra, os homens as destruíram. Na Europa medieval, uma população em rápida expansão derrubou metade das árvores para dar espaço à agricultura. Uma área de 100 milhões de hectares foi derrubada para “melhorar” a qualidade do solo. Nos países ricos, a pressão sobre as florestas diminuiu, mas nos países tropicais que abrigam metade das florestas remanescentes, a demanda por terras cultiváveis está crescendo no ritmo de crescimento da população.
Desmatando as florestas talvez enriqueçam alguns, mas em longo prazo empobrecem o planeta todo. As florestas úmidas tropicais constituem fator importante nos ciclos de água continentais. A perda da floresta tropical da Amazônia reduz a pluviosidade nas Américas, com sérias consequências para os agricultores no hemisfério Norte. Ao regularizar o escoamento, as árvores ajudam no suprimento de água e previnem desastres naturais, como inundações e desabamentos de morros. E, para aqueles preocupados com os efeitos da mudança climática, as florestas contêm duas vezes mais carbono do que a atmosfera. Perdendo as florestas perde-se milhões de espécies, pois elas detêm 80% da biodiversidade terrestre.
O desenvolvimento econômico pode ser tanto a causa do desmatamento quanto de sua redução. A globalização acelera a demanda por produtos agrícolas de países tropicais. Emergindo da pobreza, sua população torna-se mais próspera e reclama de seus governos leis que protejam o meio ambiente e fiscalizem seu comércio. A transição do desmatamento para a proteção das florestas é um processo lento demais. O principal esforço e instrumento internacional é conhecido pela sigla REDD – redução de emissões por desmatamento e degradação. Preconiza o pagamento às populações dos países em desenvolvimento para deixar as árvores em pé, o que se tornou hábito de governos e empresas pagarem por florestas e outros serviços de ecossistemas.
O único sucesso da Conferência sobre Mudança Climática de Copenhague, em dezembro de 2009, foi o compromisso de continuar o programa REDD. Países ricos, a Noruega, a Grã Bretanha e os Estados Unidos prometeram 4,5 bilhões de dólares para iniciar as atividades do projeto. Os problemas e dificuldades são enormes. Algumas das florestas em regiões tropicais situam-se em áreas de pior administração pública, elevando os custos e os riscos de desvio dos recursos eventualmente alocados. As falhas na execução dos programas significam a perda de recursos mais valiosos do planeta.
Aproximadamente metade das florestas foi dizimada pelo desmatamento, responsável pela emissão de CO2 correspondendo de 15% a 17% do total, mais do que todos os aviões, automóveis, navios e trens. Estima- se que a floresta amazônica está sequestrando 1,3 gigatoneladas de carbono, quantidade igual a emissões recentes por desmatamento. No mundo, as florestas e o solo debaixo delas absorvem quase ¼ de todas as emissões de carbono. Isto representa uma contribuição vital à vida, além de abrigar mais da metade de todas as espécies de animais, pássaros e insetos e suprir inúmeras plantas medicinais. 400 milhões de pessoas encontram nas florestas seu habitat e os meios para sua subsistência.
As florestas regulam o fluxo das águas, mitigando os riscos de inundações e de secas, como já sabiam os povos da Antiguidade, observando que as árvores aumentaram a quantidade de chuvas e seu desmatamento a reduz. Cortando árvores leva-se a uma redução da evaporo-transpiração e menor precipitação de chuvas.
No caso da floresta amazônica, isto tem profundas implicações para a agricultura das Américas. O sul do Brasil e o norte da Argentina e do Paraguai dependem da umidade trazida pelos ventos do Atlântico os quais, depois de atravessar a bacia amazônica, são desviados para o sul pelos Andes. Entretanto, o desmatamento continua. Segundo a FAO – Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentos – somente quatro bilhões de hectares das florestas remanescentes cobrem 31% da superfície terrestre, dos quais somente 1/3 é original e grande parte do resto está ameaçada ou seriamente degradada. Quase metade das florestas remanescentes situa-se nos trópicos úmidos, das quais 1/3 está no Brasil, 1/5 no Congo e na Indonésia.
A segunda maior área de florestas é constituída pelo bioma da Taiga, uma vasta região coberta por vegetação rasteira e arbustos que circunda a região extrema do hemisfério norte, na Sibéria, Escandinávia, Finlândia e Canadá. Sua vegetação é adaptada a invernos longos e rigorosos e um verão muito curto. Seu solo, a tundra, é implacavelmente frio para que arbustos e gramíneas possam crescer. Na maior parte do ano, a tundra está coberta de neve congelada. Durante o curto verão, a superfície degela, mas não há drenagem, uma vez que o subsolo é congelado, deixando a região alagadiça e pantanosa. Um aumento da temperatura devido a mudança climática irá liberar uma enorme quantidade de gás metano – o CO4 – muito mais tóxico do que o CO2. Somente 11% das florestas estão na zona temperada, destacando-se os EUA, que desmataram metade de suas florestas no século XIX, enquanto a Europa e a China dizimaram as suas bem antes. Agora, as florestas das zonas temperadas estão voltando, com o plantio de 7 milhões de hectares em programas de reflorestamento na China e nos EUA.
Nos anos de 1990, mais de 16 milhões de hectares de florestas úmidas foram desmatados, por ano, diminuindo nos anos seguintes, sobretudo nos dois países maiores responsáveis, O Brasil a Indonésia. No Brasil, a rápida expansão do setor de agropecuária levou à invasão do cerrado, rico e único bioma em sua biodiversidade. Outros países, menores, dão mostras de maior cuidado com suas florestas úmidas. A Costa Rica, que desde 1998 estava perdendo 4% de suas florestas ao ano, reduziu seu desmatamento a quase zero. Gabão e Guiana, com ¾ de seus territórios cobertos por florestas, têm manifestado que com ajuda externa poderão sustar o desmatamento.
Mas duas grandes ameaças pairam sobre as florestas úmidas tropicais. A primeira, a mudança climática, irá redesenhar o mapa de todos os ecossistemas florestais. A extensão da área florestal e cultivável para o norte seria mais do que compensada pelas secas, a aridez, pragas e fogo, todos os sintomas do aquecimento global terrestre.
Até agora (2010), 18% da floresta úmida foi derrubada. A perda de outros 2%, de acordo com o Banco Mundial, seria sentida nas regiões mais secas no sul e no sudeste. Um aumento da temperatura de 3,5ºC, estimado para o fim deste século, irá liberar grande parte das 50 gigatoneladas de carbono que as florestas têm armazenado — o equivalente a dez anos de emissões pela queimada de combustível fóssil.
A segunda grande ameaça vem dos seres humanos. Estima-se que a população mundial cresça em 50% nas próximas quatro décadas, chegando a nove bilhões. Três milhões de famintos viverão nos países pobres, particularmente nos trópicos. A população do Congo, atualmente 70 milhões, irá dobrar neste período, elevando na mesma proporção a demanda por mais alimentos. Devido à baixa produtividade agrícola, aumentará a pressão por mais terras cultiváveis. Mas o maior risco de desmatamento nos trópicos é consequência da expansão da agricultura e da pecuária, impulsionada pela demanda global por alimentos, fibras e biocombustível. O crescimento explosivo do cultivo da soja no Brasil levou à invasão do cerrado, a savana brasileira que contém nas raízes de suas plantas quase a mesma quantidade de carbono que a floresta úmida da Amazônia.
Previsões sombrias de mudança climática e a elevação recente dos preços de alimentos aumentam a preocupação com a segurança alimentar. Investidores estrangeiros dos países árabes, da China e da Coreia do Sul procuram adquirir vastas áreas para o cultivo de grãos e de soja. A demanda crescente do agronegócio tropical está na raiz do desmatamento, muitas vezes facilitado por uma legislação permissiva e incompetência da fiscalização.
Governos, ONGs e cientistas depositam suas esperanças no programa REDD, na expectativa de que os países ricos concordem pagar aos mais pobres para não cortar suas árvores. As necessidades do planeta por florestas para a absorção das emissões de carbono são praticamente ilimitadas, mas salvar as florestas remanescentes constitui uma meta modesta apenas, embora exigisse transformações radicais na gestão florestal e a aplicação da legislação dos registros de títulos de propriedade. A mais importante seria a valorização adequada das florestas, com medidas rigorosas de planejamento e de uso das terras, de desenvolvimento rural e agrícola e políticas racionais de energia e infraestrutura.
O Brasil necessita de suas florestas úmidas para controlar o clima, alimentar seus rios e gerar energia hidrelétrica. As safras de soja dependem de uma quantidade de chuvas suficiente e, as populações urbanas sempre crescentes, do abastecimento de água potável para seus múltiplos usos. Além de contribuir para a renda de pescadores, pequenos agricultores e extrativistas, a preservação das bacias hidrelétricas do assoreamento causado pelo desmatamento representa um acréscimo de centenas de milhões de dólares por ano ao PIB. Entretanto, o quadro não é totalmente negativo: para mitigar os efeitos de inundações, o Vietnã e a China estão plantando milhões de hectares de florestas.
Também, a política seguida na Costa Rica, preocupada com a conservação de suas florestas úmidas e sua biodiversidade tem desenvolvido programas de ecoturismo, altamente compensadores. Ademais, num cálculo de custo/benefício do desmatamento e os ganhos potenciais pela manutenção das florestas, devem ser incluídas as receitas derivadas de uma próspera e crescente indústria de plantas medicinais, produtos da extração florestal.
A reunião sobre Mudança Climática realizada em Copenhague, em 2009, teve como um dos resultados positivos o compromisso assumido por 58 países para levar adiante o detalhamento do projeto REDD. Alguns países ricos, como a Noruega e a Grã Bretanha, prometeram uma doação inicial de 4,5 bilhões de dólares. O financiamento do REDD no futuro permanece obscuro. Aposta-se no mercado de carbono que proverá “créditos de carbono” pelas florestas preservadas. A proposta, de gravar com impostos is emissores de carbono tem encontrado forte resistência nos países ricos, sobretudo os EUA.
Outro problema é criado pelo espectro da corrupção nos países pobres, receptores do dinheiro, particularmente os países africanos desestruturados e carentes de instituições legais e administrativas para conduzir um programa como o REDD com sucesso. A educação e a elaboração de projetos comunitários de conservação ou replantio são fundamentais para o sucesso dessas iniciativas que não podem ficar restritas e ao controle das autoridades governamentais. Em termos da economia monetária, o envolvimento e a participação das comunidades podem parecer obstáculos à “exploração “racional” das riquezas florestais. Mas, em termos de equidade, justiça social e conservação das florestas, parecem ser o único caminho.
Outro caminho complementar seria a sensibilização das grandes empresas consumidoras de produtos florestais. Em 1993, foi criado o “Forest Stewardship Council” – conselho de gestão das florestas, em uma aliança entre os “verdes” e as madeireiras, para estabelecer normas de exploração sustentável das florestas. Por enquanto, poucos aderiram ao protocolo – compromisso de utilizar somente produtos certificados pelo FSC. Também, alguns governos empreendem os primeiros passos para impor regras e sanções para a importação e o consumo de produtos certificados pelo FSC.
Em julho de 2010, a União Europeia aprovou uma lei criminalizando a importação de madeira ilegal, o que poderá ser estendido ao comércio da carne, outro grande responsável pelo desmatamento. A complexidade dos problemas relacionados à OMC, o desmatamento, a diversidade dos atores intervenientes e a incompetência de muitos governos municipais e regionais, inclinados a apoiar as reivindicações os “desenvolvimentistas” em sua batalha contra os “conservacionistas”, prometem que o embate sobre mudança climática e a sustentabilidade do processo de desenvolvimento, preconizado e defendido por todos, está longe de ter encontrado o caminho para o equacionamento e a solução dos conflitos latentes e, infelizmente, permanentes.
Henrique Rattner é professor da FEA (USP), do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e membro da Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Lideranças (ABDL).