“Por uma transa fazemos coisas inacreditáveis. Fica-se cego.” Sérgio,
39 anos, sabe do que fala. Nos últimos três anos passaram pela sua cama mais de
200 mulheres. Altas, baixas, gordas, magras. No que toca ao sexo, não tem
dúvidas quando fala da fase pós-divórcio: “É o vale tudo. Fica-se viciado na
novidade. É o prazer momentâneo.”
Com o fim do casamento de dez anos, Sérgio viu-se
“sozinho, afastado dos amigos, longe dos filhos, numa nova cidade e com
necessidade de novos laços”. A blogosfera foi a forma encontrada “para deitar
tudo cá para fora”. Inicialmente escrevia um blog de desabafos sentimentais que
acabou por “enveredar num cariz erótico e sexual”. Começou a ser seguido por
leitoras e daí ao primeiro encontro foi rápido: “Começas por manter o registo
antigo e combinas um cafezinho. Mas quando te apercebes que a conversa no
computador é 300 vezes mais rápida, vais direto ao assunto. Não há medo de
rejeição. O flerte começa com umas simples reticências e termina na cama:
Queres? Bora.”
Com o “ego recuperado”, Sérgio foi encontrando mulheres com “a mesma compulsão sexual” e
gosto pelo risco. “Estava estacionado num local movimentado e ela atirou-me
para cima do carro. Enquanto outras pessoas passavam, começou a fazer-me sexo
oral ali mesmo. Puxei de um cigarro e decidi desfrutar.”
Entre o celular e as redes sociais, todos os dias
Sérgio organizava a agenda. Num só dia chegou a estar com três mulheres
diferentes. “É sexo egoísta. Usas aquela pessoa como objeto do teu prazer.”
Embora garanta nunca ter pago a ninguém, tem uma visão prática: “Todos pagamos
para ter sexo. Nem que seja os copos que lhes oferecemos.”
Esta obsessão levou-o a falhar compromissos de família
e a inventar reuniões para sair do escritório. “Percebi que estava passando o
limite quando entrava em pânico por passar um dia sem sexo. Nunca procurei
ajuda mas tal como começou, a necessidade de novidade também se esgotou.” Hoje
vive um “namoro liberal”, baseado no diálogo. Para trás ficam exageros.
Rita diz o mesmo. Depois de sete meses a mascarar
carências afetivas com vontade de sexo, a jovem de 26 anos garante que prefere
usar um vibrador a repetir o comportamento de há dois anos
O impulso levava Rita
a procurar situações de sedução, “Chegava a ter dois a três parceiros por
semana. Por vezes os repetia, mas não queria saber sequer quem eram ou como era
a vida deles”. Heterossexual, “mas com um pezinho na bissexualidade”, a jovem
envolveu-se com homens e mulheres, por vezes com várias pessoas ao mesmo tempo
e invariavelmente levada pelo ímpeto: “Lembro-me de estar num bar com zona
privada para quem quisesse ter sexo. Senti aquela vontade, Acabei a ter sexo oral
com um homem que nunca tinha visto. Naquele momento imaginei que tanto podia
ser com ele ou com um vibrador a me estimular. Afinal, era tudo mecânico”.
Rita conta que esta foi a forma encontrada para
compensar a baixa autoestima: “Sentia-me
feia e mal-amada. Não queria envolvimento queria apenas conquistar mas
quando chegava a hora, mal sentia vontade. Às vezes fingia os orgasmos. Quando
retornava para casa encontrava o mesmo silencio e sensação de
vazio. Mais que desejo sexual, hoje sei que era desejo emocional.
Masturbar-me não era solução.”
Rogério diz o mesmo. “Podia me masturbar mas o
verdadeiro desejo que sentia era pelo risco. Era saber que estava me deixando
levar sem pensar nas consequências” Homossexual assumido, agora com 30 anos,
relembra a “longa fase de loucura compulsiva” que passou há oito anos. “Não
queria saber o nome nem o número telefone. Queria apenas aquilo,” Desde engates
de uma noite em discotecas, a “sexo combinado pela Webcam”. Rogério fez de
tudo. Tal como Sérgio. “muitas vezes faltou o preservativo”. Conta que em San
Francisco, além das míticas saunas gay e bares com o “quarto escuro”. Ha ainda
zonas onde se pode parar o carro e simplesmente “propor a quem está ao lado:
Vamos dar umazinha?” Rogerio o fez várias vezes. Depois, fumava um cigarro,
pegava o celular e já ligava para alguém com quem pudesse estar a seguir. “Era
uma bola de neve. Quanto mais sexo tinha, mais queria. O álcool ajuda à
desinibição no momento, mas também pode proporcionar sustos. Estava muito
bêbedo e fui a uma sauna. No dia seguinte um amigo contou-me que me ouviu
mantendo relações e que estava louco. Não me lembro de como fui parar em casa e
muito menos com quem estive à noite. Senti-me violado”.
Este e outros sustos fizeram-no “repensar o
comportamento”, que se prolongava há mais de dois anos. Não procurou ajuda. Mas
admite que lhe custou “controlar a ânsia quando tinha horas livres e não estava
na cama com ninguém”. Hoje, assegura que está numa fase calma e que mais que
sexo quer partilha emocional. Não se arrepende, mas a verdade é que perdeu a
conta de com quantos homens se envolveu até hoje.
Júlia
diz o mesmo. Depois de um casamento de 16 anos terminado com uma traição, o
sexo surgiu como forma de vingança. “Comecei por dormir com um colega de
trabalho e nunca mais parei”. A tristeza deu lugar a um desejo incontrolável e
Julia, a essa altura com 43 anos, de repente se viu por ai com a vida de pernas
para o ar. “Durante o dia trocava mensagens picantes com vários ao mesmo tempo.
Dava-me prazer ver qual conseguia ser mais ousado. E se de dia o trabalho ia
sendo posto de lado em prol do flerte, à noite a vida familiar também: Cheguei
a receber homens em casa com as crianças dormindo no quarto ao lado e também a
sair de casa de madrugada. Sabia que era inconsciência deixá-los sozinhos, mas
não conseguia frear a minha libido”.
As retomadas idas It discoteca “rendiam novas
conquistas”, principalmente homens “bem mais jovens”. Júlia, hoje com 46 anos
ainda não voltou a “criar laços afetivos”. “Tenho amigos coloridos, mas deixei
de acreditar no amor. A independência ninguém me tira”.
Pedro Freitas, sexologista clinico ouviu o mesmo: “Ha
cada vez mais homens e mulheres que não estão dispostos a partilhar a vida com
alguém. Têm vários amigos especiais com quem saem, com quem têm sexo, mas com
quem dormem poucas vezes.”.
Por mais que sejam bons parceiros sexuais, o
especialista garante que excesso de desejo não é a única patologia. “Já muito
se falou de ninfomania e adição sexual, mas a realidade é que o desejo hiperativo
não está designado em lugar nenhum como doença.” Contudo, esclarece: “A
compulsão sexual é sintoma de um problema, que tanto pode ser uma perturbação
de personalidade ou doença psiquiátrica como uma lesão do lobo temporal.”.
Pedro Freitas salienta que depois de uma ruptura a
extravasão é comum. “De uma forma mais ou menos saudável, em momentos de
fragilidade emocional tenta-se repor as perdas através dos ganhos” e o “sexo é
uma forma substitutiva que faz parte deste ritual”.
Assegurando que não existem estudos nem clínicas especificas para o vício do sexo, o sexologista não tem dúvidas quanto a interferência da mídia em casos como o de Tiger Woods que esteve em recuperação da compulsão sexual: “Os divórcios à americana doem. São milhões envolvidos. É mais fácil dizer que se está doente e adquirir um mal de nome simpático como os obsessivo compulsivos, ingerir um leve calmante e convencer a mulher de desistir do divórcio”.
Mas não menosprezando os casos em que o sexo demais
pode ser um problema, avisa: “Devemos preocupar-nos quando não ter sexo diariamente se torna num fator de perturbação ao bem-estar. Quando se começa a
falhar obrigações porque se está obsessivamente à procura de sexo, seja ele
real ou em sites pornográficos, é momento para parar e pensar.”