O CAVALO E OS DEPENDENTES

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Porque é que um cavalo tem capacidade para ajudar doentes com dependências? Há várias razões, explica David. Primeiro, “porque são animais altamente sensíveis”, o que se explica por estarem em “permanente estado de alerta”. Os cavalos “captam” as contradições das pessoas, as incongruências na sua linguagem gestual e corporal, “forçando-as” a baixar as defesas e a tirar as máscaras. Outro fator que ajuda na terapia é que o cavalo, não sendo uma pessoa, não emite juízos de valor.

O CAVALO E OS DEPENDENTES


Os efeitos benéficos da terapia com cavalos já são conhecidos, mas alargam-se agora ao tratamento das dependências. As sessões têm a sinceridade como ponto de partida. O cavalo, habitualmente muito dócil, não se deixava apanhar por nada. Tinham passado já duas sessões e não havia meio de interagir com “Alfonse” (nome fictício). O terapeuta perguntou-lhe qual a semelhança entre aquilo que está se passando e a sua vida.

“É a mesma coisa”, respondeu Alfonse. “As pessoas não se aproximam, porque não confiam em mim”. “E porque é que não confiam?” “Porque eu minto. Digo a todos que estou ‘limpo’, mas não é verdade — é só para me deixarem em paz.” Pela primeira vez em dois anos, Alfonse admitiu ainda não estar livre de drogas. E foi preciso um cavalo para o “desarmar”...

Estranho? Não, se ouvirmos as várias histórias de prática clínica que David Tidmarch, especialista escocês em TAC — Terapia Assistida por Cavalos (em inglês, Equine Assisted Psycho-Therapy) —, divulga em todo mundo.

Porque é que um cavalo tem capacidade para ajudar doentes com dependências? Há várias razões, explica David. Primeiro, “porque são animais altamente sensíveis”, o que se explica por estarem em “permanente estado de alerta”. Os cavalos “captam” as contradições das pessoas, as incongruências na sua linguagem gestual e corporal, “forçando-as” a baixar as defesas e a tirar as máscaras. Outro fator que ajuda na terapia é que o cavalo, não sendo uma pessoa, não emite juízos de valor. Não comenta, nem condena — é como uma testemunha silenciosa com quem se pode desabafar.

Nas sessões de TAC, trabalham-se essencialmente duas áreas: o “self-awareness” (consciência de si), em que o cavalo “obriga” o paciente a ser sincero consigo mesmo — de outro modo, não interage; e os “relacionamentos”, visto a pessoa ter de se descentrar e estabelecer uma relação com o animal. Cria-se então uma “dinâmica relacional única” entre cavalo e paciente, numa equipe terapêutica constituída por três pessoas: o conselheiro, o sujeito/paciente e o equitador.

Este tipo de terapia também apresenta bons resultados em casos de depressão, em famílias disfuncionais e junto de doentes com distúrbios alimentares. David lembra o caso de uma menina com anorexia, que se recusava a comer já há vários dias. Levaram a refeição dela para o estábulo, para o pé do cavalo. A menina acabou por comer, confessando mais tarde que não conseguiu resistir, ao ver o animal sempre comendo feno — um cavalo passa 12 a 15 horas por dia a ruminar.

Para Emanuel Fagundes, técnico na TAC, as principais vantagens desta terapia é “a rapidez do tratamento” (geralmente oito sessões são suficientes) e o fato de o paciente ficar desarmado. “Os adictos são peritos na arte da camuflagem”, explica. “Num consultório, sabem que controlam as coisas. Com o cavalo, no picadeiro, não. Nunca se sabe o que vai acontecer. Ali, o paciente não pode esquivar-se ou desconversar.” Além disso, um paciente ao ar livre, não confinado a um espaço fechado, “abre-se mais facilmente”.

A TAC surgiu há cerca de 10 anos nos EUA, e é hoje praticada na Inglaterra, na Irlanda, Bélgica, Dinamarca, Israel e África do Sul. Os tratamentos têm uma característica curiosa, já que quase nunca se monta o cavalo.


Autor: Celso Mathias
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Existe 1 comentário para esta publicação
quinta-feira, 8/7/2010 por Aparecida Mendes / Salvador Bahia
O CAVALO E OS DEPENDENTES
Maravilhosa reportagem! Parabéns!!
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