O Príncipe perfeito

domingo, 30 de maio de 2010

Descendente de D. Pedro IV de Portugal, nos documentos de identidade, o seu nome consta como Príncipe Dom João de Orleans e Bragança, mas é tratado por dom Joãozinho. Apesar da pompa de exibir no nome um título de nobreza, atitude que repetiu com os seus filhos, o príncipe mais popular do Brasil é um homem de 52 anos, informal, mais conhecido pelo seu apreço às causas ambientais e pelo trabalho como fotografo do que por qualquer outro motivo.

O Príncipe perfeito



A fotografia e o surf são apenas algumas das suas atividades. A elas há a acrescentar uma pousada, uma imobiliária, a criação de gado, o cultivo de palmito, e, até pouco tempo, a produção de cachaça, que interrompeu temporariamente “por absoluta falta de tempo”. Os seus dias são cronometrados, como se vê: além de tudo isto, ele também se ocupa com questões comunitárias e ambientais, especialmente na região de Paraty, no estado do Rio, onde estão concentrados os seus negócios.

Descendente decreto de Pedro I — Pedro IV em Portugal — dom Joãozinho pertence à quinta geração de uma família de origem portuguesa que fincou raízes no Brasil a partir de D. Pedro II. “Nossa família não só proclamou a independência como tem uma importância fundamental na formação do Brasil como nação”, diz orgulhoso.

“A preocupação com a ecologia sempre foi um traço familiar”, costuma ressaltar quando lembra a atitude vanguardista do imperador Pedro II, que, nos idos de 1865, plantou na Tijuca, no Rio, a única floresta urbana do mundo. Gosta de enfatizar, também, que “a princesa Leopoldina era botânica”, e a princesa Isabel — autora da lei que aboliu definitivamente a escravatura — acompanhava expedições botânicas pelo Brasil.

O apreço pela natureza e o conhecimento do país onde vive foram incutidos na sua formação. Enquanto os seus amigos iam passar férias para a Disneylândia, o pai levava-o a percorrer o Brasil de carro, às vezes acampando, para conhecer regiões perdidas no mapa. “Aprendi com meu pai a dar muito valor à cultura e à identidade brasileiras.”

Atualmente, um dos empenhos de dom Joãozinho é que Paraty seja reconhecida pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade. É uma forma de ajudar a preservar a arquitetura da cidade histórica, que constitui o quinto destino turístico de ingleses e franceses no Brasil e na qual tem a Pousada do Príncipe. “Se as pessoas não se engajarem na luta comunitária, este mundo vai acabar antes do que se imagina”, diz como preâmbulo às suas posições. E continua: “A ambição dos países ricos é uma coisa suicida. O consumismo de uns 30 anos para cá virou uma doença, uma obsessão a ser analisada. Hoje, você entra num shopping e compra o que não precisa. Troca de carro sem necessidade. O pior é que esse modelo tornou-se lei, todos aspiram a ele.”

Muito antes do recente relatório da ONU sobre as alterações climáticas e os efeitos do aquecimento global, dom Joãozinho já pregava uma mudança radical e rápida no comportamento do consumidor e das multinacionais. A frase que melhor sintetiza o seu pensamento é: “Pense globalmente, mas aja localmente”, um dos “slogans” dos movimentos verde. “Preocupe-se com o mundo, mas cuide do lixo do seu prédio, seja a formiguinha que você é”, apregoa.

A sua parte, ele garante que faz. Lava todas as embalagens recicláveis e tem o mesmo carro há oito anos, que só será trocado agora por um motor a álcool, porque polui menos. Roupas? Compra pouco, de tempos em tempos. “Só uso calças bege, camisa branca ou azul e terno, quando necessário. Essas roupas duram muito, tenho bermudas de vinte anos atrás.”

Esse conjunto de atitudes e opiniões torna-o um representante estimado da família real brasileira. O apreço a causas nobres, pelo menos teoricamente, faz jus à tradição aristocrática: segundo ele, exceto meia dúzia de príncipes que vivem como celebridades, há outros trezentos que se dedicam a assuntos sociais significativos nos seus países. Por isso, dom Joãozinho gosta de contar que, no ano passado, ao ser entrevistado pela revista americana “New Yorker”, deu uma resposta irônica quando a repórter lhe perguntou sobre o “Jet set”: “It’s not my beach” (não é a minha praia).

Comentários como este, e outros mais contundentes, fazem parte do seu vernáculo... se o assunto for política. Radicalmente contra a guerra do Iraque, afirma não entender como nos Estados Unidos, a maior democracia do mundo, não tenha surgido um pedido de “impeachment” na época de Presidente George W. Bush quando ele mentiu e, baseado nessa mentira, levou o país para a guerra. “Por muito menos, nós aqui no Brasil fizemos um ‘impeachment’.”

Apesar dessas observações, dom Joãozinho define-se apenas como um “patriota”, nem de esquerda nem de direita. “Os membros da família real não podem posicionar-se partidariamente”, informa. “A democracia plena é minha grande batalha, para mim as liberdades são sagradas.”

Cultivar beleza, nome e dinheiro “é uma atitude decadente”, na opinião de dom Joãozinho. Claro que o desapego a tais atributos é mais fácil para quem, como ele, nunca padeceu a falta de nenhum. Mas é sempre louvável que um príncipe avesso a revistas de celebridades acredite que nas suas páginas deveriam estar “biólogos, presidentes de ONG ou pessoas que prestem algum serviço relevante”.

Desde a juventude que dom Joãozinho pensa assim. Aos 20 anos, enquanto os seus amigos se divertiam em bares e discotecas, dom Joãozinho passava temporadas de dez dias entre os índios no Parque Nacional do Xingu. E já nessa época o príncipe fotografava: tem oito livros com fotos de natureza e temas ambientais. O mais recente é Piauí, Luz do Mar e do Sertão.

Casado com uma arquiteta que, segundo ele, também “trabalha muito”, o príncipe brasileiro difere da imagem tradicional do nobre, sobretudo na maneira como assume a paternidade. A sua filha de 17 anos tem síndrome de Down e ele é o tipo de pai cuidadoso e preocupado, que a leva ao médico, e contribui para combater o estigma social que cerca a doença. “I do my Best” (faço o meu melhor) declara com modéstia.


Autor: Adolfo de Castro
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Existe 1 comentário para esta publicação
quarta-feira, 26/5/2010 por Aparecida Mendes
O PRÍNCIPE PERFEITO
Esse é mesmo. Um exemplo bom a ser seguido. Ótima matéria, parabéns!
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