A MULHER E A MATEMÁTICA

sábado, 21 de novembro de 2009

Ao longo dos séculos, podemos observar mudanças significativas nos posicionamentos "machistas" e nas relações de "empodeeramento" homem/mulher. Contudo, a crise entre estes dois "pólos! persistem. Pesquisas indicam que as mulheres possuem um viés mais voltados para áreas de conhecimento "pedagógico", lúdico, artístico" em detrimento do perfil masculino, mais objetivo, exato... voltados então as áreas específicas a este perfil.

A MULHER E A MATEMÁTICA

 
MULHERES SERTANEJAS: SEU POTENCIAL LÓGICO-MATEMÁTICO E SUAS PRÁTICAS SÓCIO-AFETIVAS: UMA TESE

 

1-   RESUMO

 

Analisa a associação entre os aspectos de dominação masculina nos contextos sócio-culturais em relação à mulher, especificamente a sertaneja do semi-árido baiano, vítima de preconceitos limitações e estereotipias. Procura primeiramente analisar a mulher em seu ponto de vista antropológico, regional por assim dizer cultural, perpassa pelas considerações do empoderamento masculino e da vitimização feminina, considerando o aspecto simbólico destas relações. Transcorre por discussões acerca do pensamento lógico matemático, que a muito determina uma maior aplicação do mesmo pelos construtos da cognição masculina. Para tanto, constrói um modelo intrincado entre estas multi-relações, percorrendo o itinerário da possibilidade da inserção feminina no lócus do saber privilegiado ao homem, indicando caminhos de uma lógica de transformação, que faz referência à interface homem/mulher.

 

Palavras-chave: Cultura. Identidade. Gênero. Estereotipia. Formação Matemática

 

Historicamente e culturalmente, a mulher e o homem, apresentam diferenças de todas as ordens. Tradicionalmente, o homem apresenta um perfil mais objetivo, seus construtos estão mais ligados a uma maior racionalização. Cria metas, as percorre e vai aonde quer chegar. Normalmente são indicados a cursos que explorem sua racionalidade (números), objetividade, sua força física, sua intelectualização mais formal.

 

A mulher “inversamente” desenvolve em suas múltiplas inteligências, um viés mais voltado à música, a literatura, a arte. Resguardado pelo desejo da biologia, o direito das demais inteligências a serem desenvolvidas (cientificamente comprovado), pelo sexo masculino.

É eminentemente mais subjetiva, intuitiva, emocionalmente referendada, sensível e deste modo, indicada as áreas do conhecimento “pedagógico”, filosófico para não dizer “doméstico”.

 

Mas o que fazem mulheres que apresentam este perfil (filosófico, psicológico, epistemológico) em cursos de graduação de matemática?

Mulheres sertanejas, historicamente reprodutivistas de uma prática social machista. Rural. Como pensam estas mulheres, matematicamente? Como conduzem suas vidas, sociais, profissionais, afetivas? Fazem com que, seu perfil, mais “subjetivo”, perpasse o conhecimento matemático cartesiano, puro, frio, estanque e descontextualizado, o dissolva e o transforme num conhecimento, mais lúdico, real, intrincado a vida das pessoas, e por assim dizer mais “feminino”? Por que são tão poucas em número nas universidades de formação para professores de matemática? Feminizam este conhecimento? Como amam? Analisam cientificamente, equacionam suas ações, prevêem reações, calculam palavras, eliminam obstáculos?

 

A presente intenção de discussão “quebra” todos os paradigmas da ciência matemática pura, que ao longo dos anos trata o conhecimento matemático como uma linguagem meramente formal, formando profissionais para serem meros “fazedores” e “fazedoras” de aritmética e algebrismos, tornando cursos de licenciaturas em bacharelados estúpidos.

 

Considera-se a ousadia em tratar um tema, que longe dos princípios axiomáticos de seus colorários matemáticos, quer refletir sobre a pessoa que se encontra por detrás desta discussão. Aqui é o ethos que só torna essencialmente relevante: O ethos feminalis!

Ademais é desejo em realizar o presente estudo numa área que se permita este passeio inter-intra-trans-multidisciplinar, focado na discussão de gênero, nas representações sociais vinculadas à mulher em seus processos de identificação, nos regionalismos inerentes a sua condição de sertaneja na “essência feminina” e nas suas formas de ver matematicamente o mundo ou simplesmente, ver o mundo usando uma matemática mais “feminino-masculina”. 

Diante do objeto de estudo tal como aqui delimitado, tem-se norte a seguinte formulação: Como associar os processos identitários de mulheres, sertanejas e matemáticas na construção de mecanismos de inserção social, em espaços eminentemente masculinos?

 

Esta é a intenção, não se trata de um estudo poético, trata-se de um estudo que através de uma análise antropológica dessas mulheres, no seu fazer pedagógico, no seu fazer familiar, social e afetivo, buscar elementos sobre quem ela é para o nosso mundo contemporâneo, cercado de exigências massificadoras, preconceituosas e lineares.

 

Investigar-se a gama do complexo emaranhado de suas relações consigo mesma, com o outro, com a cultura do “feminino” que está atrelado às formas de representações sociais e de identificação. Atingindo em cheio as “Marias Bonitas”, mulheres essencialmente vanguardistas, em geografia, em sua história de luta, em beleza de ideais ecológicos, na biologia de reproduzir outros seres, na química de transformar um ensino frio em um colo quente, tabuada em música, e matemática em vida.

 

Nossos primeiros habitantes o homo sapiens, o homem do paleolítico superior. Forte, com altura aproximada a 1.80m, vivia essencialmente da caça, da coleta de alimentos e, para garantir sua sobrevivência, dependia da parceria exercida entre homens e mulheres.

Durante muito tempo, creditou-se ao homem a efetivação da sociedade patriarcal, porém indícios de estudos arqueológicos demonstram que a pré-história não se movia por este modelo, o que se leva a crer, que se não patriarcal, então matriarcal. Contudo não há sinais de subordinação do homem. O fato desta etno-paisagem é reafirmar que os processos de dominação masculina, não nasceram com o “homem” ou com a “mulher”, e sim algo que vem sendo socialmente construído, ao longo dos séculos.

 

O mundo moderno em suas exigências econômico-sociais, trouxe à luz a divisão sexo/poder, o que corrobora Bourdieu,

 

A ordem social funciona com uma imensa máquina simbólica que tende ratificar a dominação masculina sobre qual se alicerça: é a divisão social do trabalho, distribuição bastante estrita das atividades atribuídas a cada um dos dois sexos, de seu local, seu momento, seus instrumentos; é a estrutura do espaço, opondo o lugar de assembléia ou de mercado, reservados aos homens, a casa reservada ás mulheres. (2002, p.18).

 

 

Nos últimos 10 anos, têm-se observado níveis de regressão do indivíduo. O fim do estruturalismo trouxe em seu bojo, como nos coloca Boaventura (1996, p.18) “(...) a revalorização das práticas e dos processos e, nuns e noutros, a revalorização dos indivíduos que os protagonizavam. Contudo, observa-se aí o surgimento da exposição da vida privada”, o consumismo e o narcisismo dos modos de vida sociais e afetivos, a banalização dos sentimentos, as pessoas encaradas como “coisas” que possam ser descartadas, a complexidade do ser, do assumir-se e conseqüentemente de assumir o outro como nos aponta Bauman:

 

 

“(...) assim, se você deseja” relacionar-se “, mantenha distância; quer-se usufruir o convívio, não assuma nem exija compromissos. Deixe todas as portas sempre abertas”. (2004, p.10 e 11).

 

 

Desta maneira, o indivíduo parece ser muito mais individual e isolado do que nunca, perdido e “encontrado” pelas redes da informática, onde quer que esteja. Embora cedendo aos individualismos de seu tempo, sua vida íntima nunca foi tão pública, sua vida sexual nunca tão “codificada”, estereotipada, sua liberdade nunca foi tão enclausurada, seu trabalho tão subjugado.

 

Na efervescência contemporânea, outros elementos seguem como ingredientes deste caldeirão escaldante, estabelecem as discriminações étnicas, de gênero, de preferências sexuais, de gerações, gerando conflitos, dominações e de maneira excludentes de ver e se comportar com o outro: segregação, colonização, escravidão, luta pelo poder.

 

A paisagem está posta: Mulheres que carregam os preconceitos que esta “condição” trás, aliada a esta, outra “sub-condição”, ser originalmente fruto do semi-árido baiano e com ele a subordinação como algo arraigado no âmago do contexto sócio-cultural da sociedade. E é, nessa sociedade patriarcal, marcada por linhas visivelmente divisórias onde de um lado está o contingente masculino voltado às esferas públicas, e de outro nos recônditos de seus lares, o confinamento das mulheres, atuando nas esferas domésticas. Todavia, embora subordinadas, elas não estão destituídas do poder, muito embora ajam de forma invisível, tornando deste modo implícito seu poder. Prova disso, mulheres nos cursos de exatas, espaço este reservado a objetivação masculina.

 

Para tornar “ordenado” este trinômio: Mulheres, sertanejas e professoras de matemática e suas muitas formas de identificação cultural, bem como de estereotipação, toma-se o presente trabalho em termos previamente definidos para uma maior compreensão do todo.

 

4.1 ESSENCIALMENTE MULHERES

 

“ Eu sou uma mulher” significa que sou eu mesma como mulher enquanto ao redor de minha identidade se constroem minhas condutas e os julgamentos de valor que faço delas: positivos quando reforçam minha consciência de ser primeiramente uma mulher, negativos quando ocultam a afirmação de mim mesma como mulher. (TOURAINE, 2007, p.28).

 

A afirmação das mulheres como elas mesmas, vem tomando corpo e emergindo-se nos cenários atuais, muito embora comportamentos de estereotipia e preconceitos ainda se fazem presentes, uma vez que neste universo polarizado entre as classes que determinam o empoderamento do masculino em relação ao feminino, ainda resistem aos novos modelos de identidade, como nos confirma Hall, “Emergiu, então, uma concepção mais social do sujeito. O indivíduo passou a ser visto como mais localizado e “definido” no interior dessas grandes estruturas e formações sustentadoras da sociedade moderna.” (2006 p.30).

 

O novo se estabelece e com ele o medo, a dúvida, a desestabilização da certeza. Aprendemos com o século XIX a visão de universo obediente a uma ordem impecável, que deve ser substituída pela certeza do jogo da dialógica, aonde o medo e a incerteza vêm cedendo lugar à vontade de acompanhar a evolução do tempo.

 

Num mundo marcado pela dissolução das fronteiras, dos espaços físicos/geográficos, e de reelaborações temporais, as “velhas” certezas hierarquizadas das identidades, passam a ser revistas. Hall é enfático ao afirmar que (...) a globalização, tem sim o efeito de contestar as identidades centradas e “fechadas” de uma cultura nacional (...). (2006, p.93).

 

Desafiando a ordem e o sistema de valores patriarcais, o movimento feminista chegou a uma nova compreensão da masculinidade e da “pessoalidade” que não depende da associação da virilidade com posse de bens materiais. No seu nível mais profundo, a consciência feminina baseia-se no conhecimento existencial que as mulheres têm do fato de que todas as formas de vida são interligadas, de que a nossa existência está sempre inserida nos processos cíclicos da natureza. Por isso a consciência feminista tem por foco a busca da satisfação nos relacionamentos, e não na acumulação dos bens materiais. (CAPRA, 2002, p. 271).

 

 

Com efeito, observa-se que as mulheres dentro desta gama do global, remanescentes das construções do movimento feminista como nos descreve Capra, cujos objetivos visavam à supressão das discriminações que vitimavam as mulheres, oportunizando as mesmas a fazer o reverso da moeda e garantir uma “equiparação” de chances, se mobilizam mais uma vez e encabeçam lutas com fins a derrubar monarquias absolutas.

 

 E neste panorama atual, pós-feminismo, as mulheres não buscam construir uma “sociedade das mulheres”, considerada mais doce, subjetiva, conquistadora e diferenciada da dos homens, o que querem de fato é criar uma cultura a partir delas mesmas (TORAUNE, 2007, p.32).   Partindo deste pressuposto, a sociedade aqui indicada, ainda articula-se aos conceitos que foram sendo agregados às mulheres ao longo dos séculos, como sendo uma forma de representação baseada em estereótipos de fraqueza, sensibilidade, exacerbação de sua sexualidade em alguns casos ou completa subtração de desejos sexuais noutros. As mulheres tencionam suas próprias relações com o “mundo dos homens” a partir de uma re-elaboração de si. Deste modo não existe identidade entre o eu que cria, ama, e o eu constituído pelo outro, a partir das relações que estabelece com o outro. Ainda nos reportando a Touraine, “Eu sou uma mulher, quer dizer: “ sou mulher, eu tenho o direito de ser uma mulher de dar a este personagem o conteúdo que escolhi”. ( 2007, p.31).

 

Para a psicanálise, as estereotipias e os preconceitos de todas as ordens, são entidades “imaginárias”. Fenômenos que se instalam carregados de uma essência baseada em crenças e afetos. Neste sentido, podemos afirmar que todos nós, homens e mulheres possuímos estereótipos e preconceitos perante o outro, resta saber, quais as atitudes devemos tomar a partir da convicção desta relação.

 

Destas muitas discussões, nascem movimentos que buscam a inclusão dos “diferentes”, e a partir daí outras discussões um tanto controvertidas (quotas), vem se mobilizando. Mulheres, negros, índios, deficientes físicos, homossexuais, minorias em geral, vêm engrossando fileiras de protestos, motivadas pela leitura mais questionadora da diversidade humana.

 

Estes grupos buscam sua emancipação, embora a sociedade ainda se mantenha resistente às culturas engessadas de opressão.

“Eu sou uma mulher”, nos faz refletir sobre o fato de que as mulheres ainda estão muito presas ao mundo feminino, criado pelos homens para formar um gênero, que a subjugou pela superioridade do binômio homem-mulher, e conseqüentemente da heterosexualidade. Daí, em todos os domínios e lugares do mundo, o desejo entoado por diversas vozes que clamam uma oportunidade de serem ouvidas nas suas particularidades e no “direito de ter direitos”.

E por falar em direitos, o termo mulher vem recheado de considerações contraditórias e associado a este um outro elemento, que por sua vez também está cercado de preconceitos e estereótipos, além de limitações e segregação: As mulheres sertanejas especificamente do semi-árido baiano.

 

4.2 SERTANEJAS DO SEMI-ÁRIDO BAIANO

 

O nordeste do Brasil, caracterizado por diferentes ambientes naturais representa a maior região semi-árida do país em extensão, tão grande como a bacia Amazônica.

Durante o período da colonização, nos meados do século XVI, secas cíclicas tem marcado a vivência dos habitantes do semi-árido.

 

A vida das mulheres neste contexto, a despeito das outras mulheres oriundas das cidades cosmopolitas, tem sido efetivamente atravessada por questões relativas às secas, Assim como às políticas nelas envolvidas. Na medida em que criam soluções para o desastre climático, vão criando uma nova construção do seu “eu”, marcado pela subordinação masculina e a exploração de trabalho, uma vez que acondiciona para além de suas atividades rurais, as relativas ao cuidado da casa, dos filhos e da profissão.

 

Contribuindo deste modo para a supremacia do “homem” enquanto detentor do poderio econômico, dos melhores salários e de sua participação efetiva nas esferas públicas. Contudo, há uma via de acesso. Uma objetividade no mundo subjetivo clássico das discussões eminentente machistas: elas migraram de seu mundo subjetivo, sensível, maternal e se juntaram a tantas outras oriundas do triângulo da seca. e chegaram à universidade e pasmem, se assentaram nas cadeiras das “Exatas”. 

 

4.3 SEU POTENCIAL LÓGICO MATEMÁTICO

 

Dentre as distintas maneiras do fazer e do saber, diferença esta que se sobrepõe aos “biologismos”, como nos aponta Simone de Beauvoir:

 

É a luz, de um contexto ontológico, econômico e social, que teremos que esclarecer os dados da biologia. A sujeição da mulher à espécie, os limites de suas capacidades individuais, são fatos de estrema importância; [...} Ele só é realidade vivida enquanto assumido pela consciência através das ações e no seio de uma sociedade. (...) Trata-se de saber não como a natureza foi nela revista através da história: trata-se de saber o que a humanidade fez da fêmea humana. (1949,p. 173).

 

 

Algumas destas concepções do savou fair de homens e mulheres, indistintivamente, privilegiam a comparação, classificação, quantificação, medição, generalização. Menciona-se aqui, a um saber-fazer matemático na busca de explicação e de maneiras de lidar com o ambiente “imediato e remoto” (D´Ambrósio, 2005, p.22). Obviamente que este conhecimento é contextualizado e atende a fatores sociais e naturais.

 

O cotidiano está repleto de saberes e fazeres próprios da cultura. Há todos os instantes, homens e mulheres, estão exercendo aplicações da matemática em suas relações com pessoas, economia, geometria, enfim, com o mundo que os rodeia, mobilizando deste modo produções e configurações mentais e intelectuais que são próprios de sua formação genética e de sua cultura.

 

A matemática analisada por este prisma, responde aos apelos de respostas às pulsões vitais de “sobrevivência e transcendência” (IBIDEM), que se caracterizam por ser a síntese das questões existenciais da espécie humana.

O surgimento do pensamento matemático humano em indivíduos tem sido tema para muitas discussões e pesquisas. O cérebro está muito conhecido e já podemos afirmar muitas questões relativas à massa craniana.

 

Mas onde está a capacidade de preferir? Objetivar? Subjetivar? Sensibilizar-se?

Não há pesquisas científicas que possam dar conta destas respostas. Deste modo podemos concluir que o pensamento lógico-matemático, em suas configurações anatômicas e epistemológicas, não nos aponta para um caminho que desemboque preferencialmente nos homens.

 

Se a matemática não é ciência específica para homens, logo podemos concluir que a matemática é de domínio público, uma vez que foi criada e exercida por homens e mulheres, nas resoluções de problemas dos mais banais aos mais complexos. Contudo, ainda podemos observar que os cursos voltados para as áreas das exatas, ainda se preservam na supremacia masculina quase que absoluta. Ora, se já identificamos que, esta exclusão está longe de ser legitimada pela Biologia ou Epistemologia, devemos entender que as lacunas se devem ao preconceito ainda latente da “masculinização” da ciência.  

 

Mas algumas questões ainda rondam nossas discussões matemáticas. Há a “feminização” da educação matemática? Dada à referência história e construída socialmente que as mulheres exercem uma condição “comportamental” diferenciada dos homens, as professoras de matemática, conduzem sua prática educativa considerando este modelo? Afinal, qual a sua real identidade?

 

4.4 SUAS PRÁTICAS SÓCIO-AFETIVAS

 

A identidade e a diferença não podem ser compreendidas, pois, fora dos sistemas de significação nos quais adquirem sentidos. Não são seres da natureza, mas da cultura e dos sistemas simbólicos que a compõem. (SILVA, 1997, p.78)

 

A afirmação da identidade e a marcação da diferença, ainda considerando as discussões e estudos de Silva, implicam no equacionamento do binômio de inclusão e exclusão. Noutras palavras, o que “somos” dependerá da afirmação de quem “não somos”. Como num jogo matemático de negação: Pertence não pertence, Contido não contido, o que entra como elemento deste conjunto e o que ficará do lado de fora. Neste divisor de águas, temos de um lado homens culturalmente amparados pelo modelo patriarcal, pelo poder, e pela linguagem e do outras mulheres (sertanejas). No centro, o que vemos é o objeto da ciência, como maçã que expulsará um dos dois do paraíso, e com eles a legitimação do monopólio desta mesma ciência. Bourdieu vem corroborar com,

 

 

 (...) porque é e porque não há sujeitado social que possa ignorá-lo praticamente, as propriedades (objectivamente) simbólicas, mesmo as mais negativas, podem ser utilizadas estrategicamente em função dos interesses materiais e também simbólicos do seu portador. (2002, p.112)

 

 

Neste sentido, se estabelece visão androcêntrica, que põe em xeque os comportamentos femininos de reprodução do preconceito que dá a primazia do empoderamento ao homem, o que Bourdieu chama de “maldição”. Esta suposta “maldição está em curso, no transcorrer das situações cotidianas. A condição de subjugação feminina ocorre em seu próprio lar, na divisão dos trabalhos domésticos, da diferença salarial dos cônjuges, na maneira de criação dos filhos. Tarefas designadas ao modo” “feminino” de ser, uma vez que diante de uma situação mais conflituosa (matemática, por exemplo?), estas mulheres estarão fadadas ao fracasso. Na fração deste “bolo”, evidentemente a melhor parte ou a maior parte ficará por conta do homem. E as mulheres por sua vez, que a muito se mantém nas migalhas da história, incorporam estes esquemas de pensamento de modo simbólico, reproduzindo estas relações de poder masculino, assumindo como tal e exercitando a violência, que a vitima.

 

Contrariando as elucubrações do senso comum, mulheres emitem comportamentos em sua vida social e afetiva, a partir das representações masculinas, ora por pressão, ora por total consentimento. Isto se estende para a vida afetiva, parafraseando Bourdieu, podemos constatar que o encantamento exercido pelo poder simbólico desencadeia, na fronteira entre dominantes e dominados, muitas vezes ocorre contra sua vontade, legitimando deste modo à aceitação muitas vezes tácita dos limites que se traduzem em comportamentos envolvidos pela névoa da culpa, vergonha, timidez, amor admiração e respeito.

 

Diante destas exposições algumas pistas: Só uma estruturação política dará cabo desta condição de sujeição, ou por investimento pedagógico nas esferas educacionais, estas instituições as quais o número de estudantes do sexo feminino ainda não atingiu sua grande maioria. Estará aí o x da questão que solucionará as variáveis, fruto das já mencionadas inquietações? Colocada em outra ordem, A inserção na esfera educacional, terá como associação as formas de construção da identidade da mulher sertaneja frente a sua condição para além das “maldições” dominadoras?

 

Estas e muitas outras questões estarão sujeitas a tomar corpo durante este itinerário que porá em xeque a condição binária homem/mulher.

 

 

. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BEAVOIR, Simone - O segundo Sexo: Fatos e Mitos; trad. DIFEL-Difusão Editorial S.A. - 8ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1949.

 

BOURDIEU, Pierre-A dominação Masculina; trad. Maria Helena Kühner. - 2ª ed..Rio de Janeiro: BERTRAND BRASIL, 2002

 

____________- O poder Simbólico; trad. Fernando Tomaz (português de Portugal)- 10ª ed. Rio de Janeiro: BERTRAND BRASIL, 2007.

 

CAPRA, Fritjof-As conexões Ocultas: Ciência para uma vida sustentável; trad. Marcelo Brandão Cipolla-6ª ed. São Paulo: CULTRIX, 2007.

 

D´AMBRÓSIO, Ubiratam-Etnomatemática-elo entre as tradições e a modernidade; 2ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

 

HALL, Stuart-A identidade Cultural na Pós-modernidade; Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro-11ª ed. - Rio de Janeiro DP&A, 2006.

 

NÓVOA, António - A formação tem de passar por aqui: as histórias de vida no Projeto Prosalus. In: NÓVOA, António e FINGER, Mathias - O método (auto) biográfico e a formação. Lisboa: MS/DRHS/CFAP, 1988.

 

PRESTES, Maria Lúcia de Mesquita-A Pesquisa e a construção do Conhecimento Científico: o planejamento aos textos, da escola à academia.- 3ª ed. – São Paulo: Rêpel, 2007.

 

SILVA, Tomaz Tadeu da (Org)- Identidade e diferença: A perspectiva dos estudos Culturais. 6ª Edição. RJ: Vozes, 2000.

 

SOUSA, Cynthia Pereira de (Org.) - Memória e autobiografia: formação de mulheres e formação de professoras. Revista Brasileira de Educação, ANPED, São Paulo, nº 2, pp 61/76, Mai. /Ago. 1996.

 

TOURAINE, Alan-O mundo das mulheres; tradução de Francisco Moras. Petrópolis: Vozes, 2007.

 

 

Elis Rejane Santana da Silva é professora da UNEB- Coordenadora do Núcleo de Estudos e Ações em Gênero: Flores do Sertão/UNEB; Coordenadora no Núcleo de Pesquisas em Educação Matemática de Paulo Afonso: NUPEMPA- Membro da Sociedade Baiana de Educação Matemática pelo NUPEMPA; Pesquisadora na àrea de Gênero, Educação Matemática, Etnomatemática e Cultura e Identidade. Mulher do semi-árido baiano, graduada em matemática numa turma cuja maioria era dos sexo masculino.
 

 


Autor: Elis Rejane Santana da Silva
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Existe 4 comentários para esta publicação
quarta-feira, 25/11/2009 por Cenira da Cruz Correia
Parabéns
Adorei o artigo, vc esta de parabéns colega. Sucesssssooo
terça-feira, 24/11/2009 por ´Maria
A mulher e a Matemática.
Longa, mas de ótimo conteudo.Parabens!
terça-feira, 24/11/2009 por Regina Cele Santana
Parabéns
A matéria enfoca a verdadeira identidade e força da mulher sertaneja.Parabéns!
terça-feira, 24/11/2009 por David
Mulher brasileira!
Extensa, porém uma viagem lógica à realidade da mulher nordestina. Parabéns!
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