Empresário bem-sucedido, 59 anos, homem dedicado à família, engenheiro João Luiz Tovar pilota a máquina financeira do Espírito Santo com o desafio de, pela primeira vez, ter que passar o governo à frente com as contas em dia, sob pena de enquadramento nas punições previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Secretário da Fazenda e, por força da legislação, presidente dos conselhos das duas pernas financeiras da pasta, o Bandes (Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo) e o Banestes, há algumas semanas Tovar ocupa interinamente também a própria presidência do Banco do Estado com a missão específica de comandar o processo de sua privatização.
A autorização pela Assembléia Legislativa, com uma votação até surpreendente, já ocorreu, mas as contestações continuam. O que não assusta Tovar, convencido de que, moral e economicamente, o governo não tem outra alternativa a não ser vender o seu banco.
“Esse foi o compromisso do Estado ao tomar um empréstimo de R$ 434 milhões, em 1998. Ao se livrar dessa dívida, o governo praticamente vai dobrar sua capacidade de investimento. Banco público não consegue concorrer com os privados e só servem para gerar dívidas”, disse Tovar.
Antes da privatização, o secretário da Fazenda disse que será empreendido um forte trabalho de cobrança dos inadimplentes e de aumento do patrimônio líquido do Banestes para aumentar seu valor. A expectativa é que, com a venda, se possa pagar pelo menos os R$ 560 milhões do empréstimo tomado para saneá-lo, mas Tovar está otimista, pois considera o banco mais forte do que o de Goiás, que foi vendido com ágio de 130%.
Ele acusa, também, os opositores da privatização de estarem pensando eleitoralmente e não no futuro do Estado: “Querem que o governo se estoure, mas se esquecem de que quem paga a conta são os capixabas”.
Porque privatizar o Banestes é o que João Luiz Tovar procura responder nessa entrevista.
– Saiu uma nota nos jornais de Vitória dizendo que você é o secretário mais forte desde as épocas do Império Romano. Porque, além de secretário da Fazenda, você é presidente do Conselho do Banestes, do Conselho do Bandes e do próprio Banco do Estado. Você é tão poderoso assim mesmo?
– É uma notinha equivocada, talvez por não saberem que o secretário da Fazenda, por imposição do cargo, é automaticamente o presidente dos Conselhos do Bandes e do Banestes, duas instituições ligadas ao secretário da Fazenda. O poder é ser secretário da Fazenda, mas há outros secretários poderosos.
O fato de estar acumulando a presidência da Banestes é por uma missão que o governador confiou a mim, a partir do momento em que decidiu encaminhar à Assembléia Legislativa um projeto pedindo autorização para iniciar o processo de privatização do banco. Processo esse, diga-se de passagem, que teve origem em 1998, portanto antes de o governador José Ignácio.
Antes do final de 1998, o governador Vitor Buaiz, aproveitando-se de uma medida provisória do governo federal, usou uma linha de financiamento do Proes, que era para banco público, aberta para permitir aos bancos públicos fazerem seu saneamento financeiro para dar início ao processo de federalização e privatização, como foram os casos de vários bancos do país, como o Banespa, o Banerj, o Baneb, o Bemge. A grande maioria dos bancos públicos desse país.
– Exatamente hoje (dia 24), foi comprado pelo Bradesco o Banco do Estado do Amazonas.
– No mês de dezembro foi o Banco do Estado de Goiás, agora o do Amazonas e estão em curso mais quatro bancos, que é a linha do Banco Central por entender, muito acertadamente, que o banco público vai ficar fora do mercado financeiro em função de não ter escala de competitividade com os grandes bancos do país.
Os bancos privados fortes do país vão engolir os pequenos bancos públicos, como é o caso do nosso Banestes, e o que motivou o governador, que eu digo atrasadamente, foi o plano de ajuste fiscal. Desde 1999, quando ele assumiu o governo, o plano de ajuste fiscal, renovado a cada ano, todo final de exercício o governo do Estado apresenta as razões de porque cumpriu, porque não cumpriu as metas, porque não fez o dever de casa.
A exemplo do que o governo federal faz com o FMI, os governos dos Estados têm obrigação com o Tesouro Nacional e, anualmente, eles prestam contas. E essa meta de privatizar Banestes e Cesan, já em 99, estava não cumprida e isso se repetiu em 2000. Quando eu assumi a Fazenda em janeiro de 2001, e passei a conhecer todo o processo, comentei com o governador que há dois anos estávamos apresentando desculpas da não privatização.
Costumam colocar que na tomada do empréstimo não houve compromisso do governador. Como não houve? O Banco Central e o governo federal só concederam o empréstimo mediante esse compromisso. E estamos atrasados nisso. Em 2001 tínhamos projeto de iniciar o processo, mas foi um ano atípico, com crises energéticas e a crise política, que foi a mais dura.
Quando nos livramos das crises, iniciamos o processo de privatização, mais para o final do ano, mas o governo do José Ignácio ainda tem 12 meses pela frente, não acaba amanhã.
– Nos processos de privatização do Banerj e Banespa, que eram grandes e, portanto, complexos, houve celeuma e manifestações, mas foram vendidos com o apoio de partidos que hoje são contra a privatização do Banestes. Por que está havendo tanta pressão e celeuma e por que os partidos como PMDB, PFL, PSDB, participantes de todo o processo de privatização das telecomunicações, da energia elétrica, dos outros bancos, agora estão fazendo esse barulho aqui no Estado por causa do Banestes?
– Porque esse meu Estado é muito diferente. Às vezes as coisas certas viram erradas e as erradas viram certas. É um Estado onde alguns setores da sociedade se rebelam contra processos naturais, que acontecem em todo o Brasil. Partidos nacionais privativistas aqui são anti-privativistas.
Setores da sociedade que se organizam e vão às ruas contra a privatização de uma instituição financeira, que é a essência do capitalismo. É a luta dos resultados que se contrapõe à coisa social. No ES, ninguém vai à rua quando se privatiza a praia.
Então, o meu Estado passou recentemente por uma concessão que nada mais é do que passar para a iniciativa privada uma praia tradicional de Vitória. Quem vai estacionar na praia vai ter que pagar. Não houve celeuma, a imprensa abordou timidamente o assunto, não vi destaque nesse debate. E fazem uma tremenda pressão em cima dos deputados, que votaram conscientemente, até porque o governo explicou todos os pontos polêmicos: desemprego em massa, fechamento de agências, sem demissão incentivada.
Foi tudo colocado no projeto de lei, e essa foi a razão de os deputados darem o aval para o Poder Executivo iniciar a privatização.
O Banestes é um banco forte. O fato de ter pontos de atendimento em todos os lugares do Estado, e a colocação é de que nenhum banco privado vai fazer isso, eu penso diferente: aí é que vai. Esse é que é o ativo do Banestes. Os ativos importantes de um banco são: número de clientes, caixa único do governo, que a gente pediu autorização da Assembléia, e postos de atendimento.
Quem comprar vai manter o nome Banestes, porque é assim nos outros Estados. A injeção de recursos privados no banco, que a meu ver é o grande problema, é muito maior do que o passivo que o banco tem com o Estado. O Banestes hoje é responsável por 22% da dívida pública do Estado. Como responsável pela gestão financeira do Estado, digo que o empréstimo tomado pelo governo em novembro de 1998 foi de R$ 434 milhões.
O governo José Ignácio já pagou R$ 141 milhões e estamos devendo R$ 560 milhões. É uma bola de neve. Além de o governo precisar reduzir sua dívida pública, e eu acho que instituição financeira não é papel do governo, temos a necessidade, e se fala pouco nisso, de injetar mais recursos para enfrentar a guerra do Bradesco, Itaú, Unibanco, HSBC e alguns bancos internacionais que devem vir aqui disputar o Banestes, e o Estado não tem esse dinheiro.
– Por que tem que injetar grana no Banestes?
– Porque, para competir, um banco tem que ser forte, precisa ter mais dinheiro para disputar o mercado em condições de ganhar o mercado. É capitalizar, modernizar, informatizar, fazer mídia de que é o maior banco daqui, e vai ser mesmo. É aquela celeuma. Alguns prefeitos estão equivocados. Cliente não vai ao banco só porque é público, vai se é bem atendido. Esse é o ativo maior de um banco.
O cliente quer ser bem atendido e ter um banco múltiplo nesse Estado, e é o que a gente espera que aconteça com o ingresso de um banco forte para comprar o Banestes. E o Banco Central colocou com muita clareza a visão das instituições financeiras desse país, que esse é o momento certo, um momento de disputa.
Recentemente, o BEG (Goiás) teve um ágio de 130% do valor mínimo da avaliação.
– Qual o valor mínimo do Banestes e quanto o sr. acha que pode ser conseguido em sua venda?
– É difícil antecipar, porque agora é que vai ser contratada uma empresa para levantar os ativos e passivos e estabelecer o valor mínimo do banco. Mas o patrimônio líquido do banco é de R$ 100 milhões, o que é até baixo. Mas ele tem outros ativos importantes.
– Quais são esses ativos?
– São 600 mil clientes, e para efeito de comparação podemos ver o Banco do Amazonas, que tem 180 mil clientes e foi arrematado por R$ 180 milhões. Todos os municípios do Estado têm pontos de atendimento, 2.400 funcionários. Essa preocupação de desemprego posso falar dela, porque estou vivendo mais de perto o Banestes agora.
Há um Plano de Demissão Incentivada e já assinei várias nesse curto espaço de tempo. E isso continuará. Esses recursos injetados em 1998 já permitiram ao banco fazer um enxugamento relativo. É reconhecidamente um dos mais informatizados do país e a informatização é que gera desemprego. Isso é notório.
Fiz um levantamento com o Recursos Humanos e nesses próximos quatro anos o banco terá entre 400 a 500 funcionários se aposentando. Vai ter é emprego. Quem comprar o Banestes vai comprar para entrar disputando o mercado, para ser um banco forte, capitalizado, modernizado. Não vejo porque o bom funcionário do Banestes estar preocupado.
– O sr. usou dois termos de banco forte para o Banestes. Inicialmente, disse que o Banestes é um banco forte em função de sua clientela, de sua rede de agências, e depois disse que é preciso privatizá-lo para torná-lo forte. Qual a distinção que o sr. faz em relação a esses conceitos?
– O forte e o mais forte. O Banestes é um banco forte após o saneamento financeiro com recursos que o Estado, seu acionista majoritário, assumiu. Agora, o Estado, que é o pai, quer que o filho pague a conta. O assunto privatização do Banestes está sendo tratado politicamente, mas é essencialmente econômico-financeiro. O Estado precisa disso, porque a Lei de Responsabilidade Fiscal é duríssima.
O Estado precisa se desvencilhar daquilo que não é absolutamente necessário. E, certamente, instituição financeira para disputar o mercado, se ficar nas mãos do Estado, não vai acompanhar o processo.
– Então, vamos ver se entendemos: temos um banco forte, cuja força está calçada no dinheiro que o pai, o Estado, colocou lá dentro. Só que o pai agora precisa desse dinheiro para dar aos outros filhos, educação, saúde e segurança, que ficaram à parte. É isso?
– É exatamente isso. O Estado tem os seus compromissos e se cometem muitas injustiças. O governo José Ignácio está pagando contas do governo passado, isso é que é verdade. Mensalmente, o governo tem uma receita líquida média disponível de R$ 138 milhões. Pela ordem de prioridade, para pagar pessoal, repassar aos poderes, pagar dívida pública, custeio e investimentos.
Não se pode deixar de pagar o pessoal e nem deixar de fazer os repasses aos outros poderes, o Judiciário e o Legislativo. Se não pagarmos a dívida pública, não recebemos os repasses federais, o FPE (Fundo de Participação dos Estados) e outros. Depois, o custeio e, por último dos últimos, o que é uma grande inversão, quanto o governo está transferindo para a sociedade, através de investimentos.
– Qual é essa capacidade de investimentos do governo hoje?
– Em média, gastamos R$ 70 milhões com pessoal, incluídos os R$ 7 milhões que estamos pagando em consignação dos salários de outubro, novembro e dezembro de 1998. A grande injustiça começa por aí. O José Ignácio está pagando R$ 7 milhões por mês para honrar compromissos de três meses do governo passado.
Repassamos entre R$ 30 e 35 milhões por mês aos outros poderes. Não podemos deixar de repassar para os deputados, serventuários da Justiça, desembargadores e tudo o mais. Isso é pessoal.
Dívida pública, R$ 20 milhões por mês. Custeio, R$ 14 a 15 milhões. Sobra, em média, R$ 5 milhões para investimentos.
– Já estourou a conta.
– Pois é. E apenas em torno de 4% são retornados em investimentos para a sociedade, o que é muito pouco. Então, o que fazer? Vamos deixar de pagar os salários de outubro, novembro e dezembro? O investimento passaria de 4% para 11%. Mas não pode mexer nos salários do pessoal.
Repasse aos outros poderes, os duodécimos, podemos alterar seu orçamento anual aprovado pela Assembléia? Não podemos.
O seguinte: dívida pública. Dos R$ 20 milhões, o Banestes custa R$ 5 milhões por mês, porque estamos pagando o empréstimo que o pai tomou para o filho. Aqui, temos que parar a bola e ver. Não podemos continuar, até porque foi compromisso do governo, e não do governador Vitor. Acho que ele agiu certo. Se o Banestes não tomasse esse empréstimo em 98, certamente teria que ir à liquidação.
Esse empréstimo foi condicionado. Quando vejo a oposição falar que não havia nada escrito, penso no pai que chega para o filho e diz: “Filho, tenho outras prioridades, com os seus irmãos pobres, não posso ficar com esse compromisso”.
É aí o início do processo de tentativa de privatizar. Esses recursos serão levados para a sociedade. Assim como a Cesan, que tem os empréstimos que o governo fez no BNDES, de R$ 120 milhões, dando as ações da Cesan como garantia no processo de privatização. E tem três anos e meio que não veio. E quem está pagando essa conta é o papai. Custa aproximadamente R$ 2 milhões. A conta custa 12% da dívida pública, e 17% o Banestes.
Vamos tirar esse passivo das costas do governo.
Eu até respeito alguns partidos que, ideologicamente, são antiprivatizações, como é o caso do PT. Só que eles não falam no Zeca do PT, no Mato Grosso, que privatizou o banco. Eles trazem o presidente do Banco do Rio Grande do Sul, que é um dos quatro que restam para privatizar.
No mundo globalizado, o amanhã é futuro. Agora, vamos nos dedicar diuturnamente para profissionalizar o banco, dar mais musculatura, talvez até aumentar o patrimônio líquido do banco, para levá-lo a leilão no pico mais alto, na busca da maior oferta, para nos liberar do passivo de R$ 560 milhões. E tenho muita expectativa de o nosso banco ser muito disputado no mercado financeiro.
– Dá uns 100% de ágio, o sr. acha?
– Não sei. O de Goiás deu 120%, foi arrematado por R$ 640 milhões, e o nosso banco é mais forte do que o de Goiás.
– Dentro do que o sr. falou, o Estado vai dobrar sua capacidade de investimentos livrando-se da dívida do Banestes?
– O Estado passaria a quase dobrar, diante do que se investiu em média no ano passado, que foi R$ 5,6 milhões ao mês. Hoje está em R$ 4,8 milhões. Vamos ter 80% a mais. É um dever de quem está como secretário da Fazenda. Tenho consciência disso, para caminharmos dentro da linha dos serviços sociais, saúde, educação e segurança.
– Uma vez que já está autorizado, esse processo será encerrado em quanto tempo? A partir de que mês o Estado quase dobraria sua capacidade de investimentos?
– Nossa meta são seis meses. O importante é dar início.
– O que significaria que o governador José Ignácio deixaria maior capacidade de investimento do Estado para o próximo governo, se não for ele mesmo. Porque em julho pára tudo.
– Os que estão na onda de não privatizar o banco e têm pretensão de sentar na cadeira de governador, no fundo, torcem para privatizar. Vão receber um Estado com capacidade de investimento maior, sem dívidas nas costas, mas levantam a bandeira da não privatização porque o fim eleitoral me parece maior do que os interesses do Estado.
– Qual é a tão decantada função social do banco, como argumentam as oposições ao governador José Ignácio?
– Confesso que não sei. Vamos inverter. Hoje o governo é o maior acionista do banco, tem um empréstimo representativo, que se não privatizar chega a dívida a R$ 620 milhões. O governo é o maior dono do banco, tem dívida grande que o filho Banestes causou, e as pessoas acham que o governo usa o banco. Já foi o tempo.
A partir dos Proer e dos Proes, o Banco Central e o governo federal estabeleceram regras duríssimas. Por isso os governos estão vendendo seus bancos. Num passado remoto, outros governos aproveitaram-se dos bancos. Mas acabou a farra. Não convém a nenhum governo ficar com banco. Essa é a causa primordial para os governos como de Minas, Bahia, Rio, para falar só dos estados que nos cercam, terem vendido seus bancos.
O governador Mário Covas, reverenciado aí como símbolo nacional, deu início ao processo ao federalizar o Banespa. Haverá quem diga: o Banespa era diferente, passou mas continua devendo. Claro, estava numa situação tão desesperadora que vendeu e continuou devendo. O governo de São Paulo transferiu o Banespa para o Santander e ficou devendo. Não é nosso caso.
Vamos supor, mas isso não vai acontecer, que vendesse só por R$ 500 milhões. Ficaria devendo só R$ 60 milhões.
– Com a venda do Banestes, o governo paga a dívida dele?
– Constará no edital, mas é uma questão semântica. No fundo, a grande preocupação política é o governo José Ignácio se fortalecer em termos de receita num ano eleitoral. É o pano de fundo da oposição, mas, no nosso caso, consta da lei, amassando o discurso da oposição, que os recursos da venda do Banestes serão integralmente utilizados para pagamento da dívida que foi contraída. Ficando o diferencial para pagamento fiscal e financeiro. Isto é, pagar dívidas fiscais e financeiras.
A oposição ficou sem discurso. Esses recursos não serão colocados nas mãos do Estado para fazer investimentos, mas para reduzir a dívida pública e permitir que o Estado fique livre do seu passivo.
– Secretário, neste caso, quem casa com a viúva assume os filhos? O Banestes tem uma inadimplência grande na praça. Tive oportunidade de examinar os documentos da primeira CPI da Inadimplência e constatei que a inadimplência dos tomadores de dinheiro no banco tem, em mais de sua metade, como avalistas legais ou morais lideranças políticas de nosso Estado. Como vai ficar essa pendência? (Caldas)
– Esses seis meses vão ser de alto profissionalismo no Banestes. Meu grande desafio é colocar pessoas absolutamente comprometidas com o fortalecimento do banco, atuando fortemente junto aos inadimplentes, a exemplo do que fizemos no Bandes, que é um banco menor, que não tem o estoque que tem o Banestes.
Vamos buscar, com o apoio do Banco Central, com pessoas qualificadas do mercado financeiro deste país, para conseguirmos um reforço substancial do banco, com um duro ataque à inadimplência, fazer aplicações financeiras, cobrar de quem deve, para em curto espaço de tempo dar mais musculatura ao Banestes.
– Pelo menos nos últimos seis anos muito se falou em reduzir essa inadimplência e o banco não conseguiu. O sr. acredita que possa, em seis meses, realizar isso?
– Quem está à frente de um banco público tem muita dificuldade. Fazer recebimento de devedores é muito difícil. Vamos tentar colocar a Procuradoria-Geral do Estado a serviço do banco tentando fazer esses recebimentos, eliminando uma série de penalidades que geram essa inadimplência. As penalidades de um devedor geram um grande problema para o próprio credor, que é o banco.
Tenho experiência própria com isso. O contrato de um banco é tão canino que causa problema para o banco. O sujeito toma um empréstimo e, se ousar não pagar no prazo, isso vira uma bola de neve tão negativa que fica uma dívida me engana que eu gosto. O banco se engana que tem aquele crédito e o devedor não pode pagar. A própria Justiça dá ganhos de causa. A dívida fica impagável. O recebível fica irrecebível.
– Essa é uma das razões pelas quais se deve vender os bancos públicos? Para que possam ser administradas com estruturas mais leves e eficientes?
– Com certeza. Sempre digo que o melhor que um dirigente de um banco público tem a fazer é não fazer nada. Porque não se compromete, amanhã o Tribunal de Contas não vem em cima dele. Esse é o cerne da razão de o banco público não acompanhar a instituição privada.
O gerente de uma instituição privada tem autonomia, porque o mundo é do momento, tem que resolver. Se um cliente devedor chega lá e diz que quer pagar, ele faz um acordo. Pendura, divide. Num banco público, você tem que montar um processo, reunir a diretoria, reunir o Conselho, porque, quando você sai, daqui a dois a três anos recebe uma notificação do Tribunal de Contas questionando a negociação.
Por isso que banco público não dá lucro. O banco público que tiver dirigente ousado, no bom sentido, este corre o risco de ir preso. A humanidade é muito cruel. Amanhã ele recebe uma notificação, e não percebem que, se ele não fizesse aquilo, não receberia nunca.
– O presidente do Supremo Tribunal, Marco Aurélio Mello, reclamou numa entrevista à VidaBrasil que 80% das demandas vêm do poder público, porque, ainda que sabendo que vai perder, o dirigente público vai até a última instância para depois não ir preso.
– O administrador público financeiro, se for consciente, não deve fazer nada. Isso em tese. O sujeito deve R$ 10 milhões, qualquer juiz dá ganho de causa para ele, porque é impagável, e quer pagar. E você, como dirigente, diz: “Mas eu não tenho condições de fazer isso. Não posso tirar um real”. E não pode mesmo.
Então, toda essa celeuma de porque privatizar o banco é porque não cabe no mercado um banco público por tudo isso que se falou.
Primeiro, por essa dívida que não pode assumir, porque banco não é primordial. Segundo, porque no mercado competitivo de banco privado, que injetam dinheiro para disputar, o governo não tem como competir. Vai tirar dinheiro do caixa para injetar em banco? E, terceiro, essa postura de administrador público, que não tem liberdade para reduzir o índice de inadimplência, que é cada vez maior e foge da linha de competitividade de banco privado.
– A gente sabe que, do ponto de vista técnico, banco público tem que ser privatizado, tanto é que 90% já o foram. Mas a gente sente que aqui o problema não é mais técnico, e sim político. E aqui no Estado temos a infelicidade de projetar, nos momentos do embate político, uma imagem muito ruim do Espírito Santo na imprensa nacional. Eu vi na “Época”, revista de circulação nacional, que estava sendo montada uma estrutura, capitaneada pelo José Carlos Gratz, para comprar o banco. O sr. leu isso?
– Li. É uma indignidade. Aqui, o empresário de sucesso é combatido. As pessoas falam de empresários respeitados, que querem comprar o banco com moeda podre, precatórios. Isso é um absurdo. Está na lei. Não se brinca com privatização de banco. O Banco Central acompanha passo a passo. Falar em utilização de precatórios é uma indignidade.
Acusar, antecipadamente, um empresário de sucesso, que deveríamos nos regozijar de tê-lo aqui, é ridículo. É por essa razão que somos pequenos. Que as pessoas às vezes querem fugir, porque não se perdoa quem tem sucesso. O sucesso perturba o capixaba.
– O sr. falou das dívidas que o Vitor deixou como herança para o atual governo. O governo de José Ignácio fez dívidas para o seu sucessor?
– O governo do José Ignácio está pagando contas. Mas o Vitor fez acertadamente. Tomou para o filho que estava com a perna fraca, para que fizéssemos isso hoje. O governo José Ignácio não vendeu nada, não tomou um real de empréstimo, está cumprindo compromissos de governo.
E vai acontecer o processo da Cesan, porque o governador José Ignácio não vai recuar, vai continuar no caminho que precisa ser seguido, é um papel dele de estadista, contra a opinião equivocada de pessoas que não querem bem ao Estado. Querer deixar para 2003 é uma leviandade, é fugir da responsabilidade cívica de homem público.
Fico impressionado como as coisas acontecem aqui, porque até agora ninguém falou que não é favorável à privatização do Banestes porque é ruim para o Estado. É ruim para o banco, talvez. Ruim para alguns funcionários que entendem, equivocadamente, que amanhã estarão na rua. Mas o Estado são mais de 3 milhões de habitantes, e temos que olhar para todo o Estado.
Alguns deputados falam para conversar sobre isso em outubro de 2002. Isso é lamentável. Quantas voltas dá o mundo de janeiro a outubro? É o mundo da agilidade, não pode deixar para amanhã. O José Ignácio podia empurrar isso com a barriga, se quisesse. Mas ele é um homem público, que sabe de seu dever.
– Vou aproveitar a presença do secretário da Fazenda, para fazer uma pergunta que não quer calar. O sr. mesmo mencionou que o governo atual paga consignações do governo passado, de três meses de salários atrasados. Naquele período, a Assembléia também não recebeu repasses, os fornecedores ficaram com suas contas atrasadas. E o Estado tinha arrecadação de R$ 120 milhões. Onde foi parar a arrecadação desses três últimos meses do governo Vitor? O sr. sabe me responder isso?
– Não só isso, mas os compromissos do Fundap, que deram aquela celeuma, até em nível de Brasil, envolvendo a Xerox. Como o José Ignácio vai honrar isso? Mas a receita líquida era de R$ 100 milhões por mês.
– Mesmo assim. Teríamos, então, R$ 300 milhões indo pelo ralo?
– Não sei. É uma pergunta que cabe ao secretário da época responder. Eu só diria a você que essa situação culmina com tudo isso que eu falei, a necessidade da privatização para o encerramento do exercício de 2002.
A partir de 2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal é duríssima para os governantes. O governo vai chegar em dezembro com a folha em dia. Não pode passar o governo devendo dezembro. Ou paga ou deixa o dinheiro em caixa para pagar.
– Mas ele já chegou tendo que pagar o 13º dos servidores.
– Ele já chegou pagando o 13º. Isso é uma diferença brutal. O papel do secretário da Fazenda é duríssimo, tendo que cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal no último ano de governo. E de um governo que chegou tendo que pagar três meses de salários atrasados, mais a folha do 13º. Veja o contra-senso com alguém que pagou mais de R$ 400 milhões deixados pelo anterior.
Por isso é que quem está na gestão financeira, como nós, tem que maximizar receita e minimizar despesas. Salários não podemos reduzir. Pelo contrário, o governo está dando reajustes salariais aí. Cortar repasses para os outros poderes não pode. Então, tem que tirar a dívida das costas e buscar outras fontes de receita para chegar dezembro e entregar o Estado enxuto para o novo governador.
E essas fontes seriam a privatização do Banestes e da Cesan. Agora, a oposição não quer nada disso. Quer o quanto pior melhor. Deixa morrer o governo. Estão esquecendo do Estado. É a filosofia da terra arrasada. A responsabilidade de cumprir a lei é do governador José Ignácio.
Estão pensando eleitoralmente.
– Você entrou na vida pública com o Camata e atravessou os governos do José Moraes, Max Mauro, Albuino, Vitor e, agora, José Ignácio. Qual a razão para uma longevidade política dessa?
– Só não participei do governo do Vitor Buaiz. E havia sido candidato a vice-prefeito na chapa do João Coser, para a Prefeitura de Vitória. O que me qualifica talvez seja minha determinação em dar o melhor de mim em tudo. Quando abraço a causa pública, faço as coisas como se privadas fossem. Desgasto-me, mas vou até o fim. As pessoas que me conhecem sabem que me disponho à vida pública. Talvez eu esteja errado, porque familiarmente me prejudica muito e os meus sócios sofrem, porque sou empresário e eles têm que segurar a barra sozinhos. Mas eles levam a vida muito mais saudavelmente do que eu.
No caso específico do José Ignácio, é interessante. Sou amigo do ex-governador Albuino Azeredo, que foi meu colega de classe. Ele me convidou para ser o secretário dos Transportes e Obras Públicas. Depois, tentei a vida política com o Coser. Quando o governador José Ignácio me convidou, fiquei até na dúvida com essa confiança, porque ele não era meu amigo, e hoje é.
Eu o questionei, e ele falou que havia visto o retrospecto do Bandes e viu que no período de 93 a 94 o banco deu resultado. Ele me convocou. Eu ainda hesitei, pedi para ele pensar bem, mas ele insistiu, e confia muito em mim, e eu o respeito muito por tudo o que ele é. Uma pessoa que delega e cobra. Estou muito feliz por ser uma pessoa de confiança dele
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