O empresário holandês Victor Muller tem duas visões: ressuscitar a Fokker e colocar a Holanda no ar e nas pistas de corrida. O renascer da prestigiada marca Spyker, fechada há 74 anos, foi o primeiro passo
Victor Muller alimenta um sonho: devolver à indústria auto mobilística e aeronáutica do seu país o antigo lugar de destaque. “Eu adorava construir aviões, mas isso pode esperar. No momento, estou voltado para os carros”. Voltar a pôr de pé a Fokker - que deixou de funcionar há cinco anos - é outro dos projetos de Muller, mas o processo de reabertura da Spyker - a famosa construtora de carros holandeses que fechou as portas há 74 anos - vai de vento em popa. “Eu adoro a Holanda e... adoro carros. E isto é o reviver da glória holandesa”, afirma Muller, contentíssimo por os seus Spyker C8 (inteiramente artesanal), Spyder e C8 Laviolette serem um sucesso. Muller, colecionador de carros, 41 anos, dois metros de altura e um olhar de menino, tem uma “frota” de 40 valiosos veículos, que vão desde o clássico Alfa Romeo Spider aos Aston Martin, passando por vários Ferraris de corrida. Em 1997, Victor Muller encontrou o parceiro ideal, Maarten de Bruijn, um designer de automóveis de 35 anos, que tinha investido todas as economias na construção de um carro esportivo para uso próprio.
Em Le Mans - Quatro anos mais tarde, com o primeiro carro da equipe ainda para sair de linha de produção, os dois homens (que esperam, agora, lançar o seu terceiro modelo em setembro, em Frankfurt - um carro de corridas GT3 Le Mans), já possuem uma lucrativa empresa de fabricação de automóveis, cuja produção para os próximos 18 meses está toda vendida.
“As vendas são aquilo que menos me preocupa. Não preciso de marketing, estes carros fazem sua publicidade por si próprios: já vendo tudo o que posso vender. Agora, quero construir um veículo de alta qualidade, e sei do que estou falando, pois sou o seu ‘cliente-alvo’. Todo mundo pode comprar um Ferrari - a sua exclusividade é muito relativa, pois fabricam-se 4 mil carros por ano. A Aston Martin fabrica 1,5 mil e está no limite da exclusividade. Nós estamos fabricando um carro para pessoas que já experimentaram os outros todos e que se dão ao luxo de ter algo muito especial” - adianta Muller. “Enquanto que um Ferrari se compra já montado, um Spyker é fabricado de acordo com os gostos e as orientações pessoais de cada um”- acrescenta.
Nos últimos quatro meses, Muller e De Bruijn conseguiram vender 34 dos seus 400 Spykers apenas na Europa - e só precisavam vender 25 para cobrir os custos de fabricação. O Spyker C8 Spyder custa U$ 173 mil sem impostos, e ganhou um prêmio de design, na primeira feira onde foi exibido (Birmingham Auto Show).
Na senda dos TRV - Sendo, tal como Muller, um grande entusiasta de automóveis, De Bruin começou, aos 16 anos, a transformar um Simca 1100 num carro de corridas, que guiava pelos bosques. “Sempre que olhava para um Ferrari ou para um Porsche, descobria algum pormenor que gostaria de modificar. Foi então que, como não conseguia encontrar o carro ideal, comecei a conceber o carro dos meus sonhos: em 1996, construí o primeiro protótipo do “C8”, na minha garagem, e comecei a dar voltas com ele, o que me ajudou a construir este Spyder”, afirmou.
De Bruijn inspirou-se muito em Trevor Wilkinson, que concebeu o TRV, nos anos 60: “Se Wilkinson, na época, conseguiu concretizar os seus planos, eu agora também posso conseguir.”
Muitos grandes bancos holandeses recusaram-se a financiar o design de De Bruijn, convencidos de que, de saída, qualquer tentativa de construir um carro holandês que fizesse concorrência à Ferrari - ou a outras marcas - redundaria num fracasso. Felizmente, um dos sócios do empresário holandês apresentou-lhe Victor Muller, que se dispôs financiar os seus projetos. Depois, Maarten passou 18 meses aperfeiçoando o seu modelo. Na Inglaterra, na Coventry Prototype Panels Ltda., a “dupla holandesa” mandou fazer um protótipo do “C8” original do designer. E resolveram, ainda, alargar e aumentar o tamanho do suporte das rodas do “C8”.
“Cadillacs” holandeses - Para comercializar o seu novo “brinquedo”, Muller comprou os direitos da extinta marca Spyker: “Agora, a Holanda tem uma marca topo-de-linha, que se pode comparar à Rolls Royce, à Bentley e à Cadillac, uma marca que já existia muito antes da Ferrari”, diz ele.
O produto resultante foi um carro leve, esportivo, de dois assentos, com chassis e painel de instrumentos em alumínio - feito à mão, com portas da frente articuladas e partes dianteira e traseira que abrem completamente. Está, ainda, equipado com suspensões independentes e totalmente ajustáveis na frente e atrás, em aço inoxidável, e com um motor Audi, topo-de-linha, de alumínio. O design das portas e o original sistema elétrico, descentralizado, foram patenteados separadamente.
A produção deverá começar em julho, numa fábrica nova, construída de propósito na cidade holandesa de Zeewolde. Os chassis serão fornecidos pela Polynorm NV, uma importante fábrica holandesa de pneus que conta, entre os seus clientes, com a Jaguar e a Mercedes; os painéis de instrumentos provêm da Coventry e a Koni dispensará amortecedores de Fórmula 1.
Os compradores receberão um número de chassis personalizado, gravado numa placa, bem como um casaco feito sob medida, da marca de Muller - a McGregor. Em Zeewolde, cada caro será “seguido” por uma câmara, de forma que o comprador possa seguir passo a passo a sua produção, no www.spykercars.com, o site da Spyker
Visionários...
Há pouco mais de cem anos, dois irmãos de apelido Spijker, Hendrik-Jan e Jacobus, realizaram um sonho: montar uma fábrica de automóveis na Holanda. Adaptado o apelido da família a uma sonoridade mais internacional, a marca dos automóveis a produzir passou a ser “Spyker”. O seu virtuosismo técnico deixou à indústria automobilística dois grandes legados: a tração integral e o motor de seis cilindros. Infelizmente, as suas capacidades de gestão financeira não igualavam a iventiva mecânica e a Spyker fechou as suas portas em 1925. Retomando o sonho dos irmãos Spijker 74 anos depois, Victor Muller relançou a velha marca, esperando repor a Holanda no mapa da produção automobilística mundial.
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